
“O primeiro ponto que trazem é que o momento atual é de muita cautela em relação ao setor externo, o segundo são os riscos da atividade econômica mais forte que a esperada”, afirma, destacando ainda a cautela com a situação fiscal, o principal motivo para a elevação do prêmio de risco da inflação implícita.
Nessa avaliação externa, chamam a atenção os comentários sobre impactos em países emergentes tanto da magnitude das respostas às políticas contracíclicas da China, e os possíveis efeitos nos preços de commodities, como os riscos de elevação das taxas de juros nos países desenvolvidos, como nos Estados Unidos.
Mirella cita ainda a discussão sobre tema como o hiato do produto (a diferença entre o PIB realizado e o potencial estimado para a economia) e sobre a taxa de juros neutra (que permite o crescimento da economia sem pressões inflacionárias. “Eles colocam um elevado grau de incerteza para ambos os lados, tanto parta um hiato mais fechado quanto para o hiato mais aberto”, explica. O BC optou, por ora, em manter a taxa no patamar atual, de 4,5%.
A economista lembra que a exposição desse argumentos dentro do Copom é importante porque, dependendo o lado para o qual o pêndulo tender, a política monetária terá de responder de uma forma diferente.
Um visão mais suave (“dovish”) é que o hiato estaria mais fechado pelo crescimento econômico via oferta (em especial pelo setor agropecuário) e com potencial mais alto. Do lado mais “hawkish”, a leitura seria de uma atividade via mercado de trabalho mais aquecido e portanto com uma taxa de juros neutra mais alta. Ou seja, de um lado o BC poderia acelerar os cortes, do outro, isso não seria recomendável.
Rafaela Vitória, economista chefe do Banco Inter, também avalia que, com o aumento do risco no cenário e a expectativa de inflação longa ainda acima da meta, o Copom descartou uma alteração no atual ritmo de cortes da Selic. “Mantemos nossa previsão de reduções de 50 p.b. até a reunião de março de 2024, desacelerando para 25 p.b a partir do 2º trimestre, terminando o ciclo em 9% ao final de 2024”, estima.
Segundo ela, apesar do cenário de maior cautela, que justifica o ritmo mais moderado de cortes, com a queda da inflação corrente, incluindo a inflação de serviços que tinha sinais de mais persistência, a Selic em 12,75% ainda está em patamar bastante restritivo, com juro real ex-post próximo de 8%. E que há ainda claro espaço para cortes.
Marcos de Marchi, economista chefe da Oriz Partners, argumenta que, ainda que o BC tenha destaco a melhora qualitativa da inflação, especialmente a de serviços, o documento passa longe da discussão de uma possível aceleração do ciclo de cortes. “Na verdade, fica a sensação de que o risco é de o ciclo de queda de juros ser menos profundo e mais cautelosa do previamente imaginado.”
Marco Caruso, economista chefe do PicPay, concorda. Para ele, a Ata estende a discussão que já estava no comunicado, que também foi ‘’hawkish”, não só no sentido de sinalizar que um corte de 75 pontos-base não faz sentido agora, mas até para tirar totalmente do cenário a projeção de aceleração.
Ele também afirma que cada visão sobre esse tema traz um desafio diferente. Se a visão é de demanda, fica mais complicado em se falar em juro muito baixo porque isso realimentaria inflação. Se é de oferta, é o contrário, porque haveria uma capacidade de produção sem aumentar a inflação. “A princípio, me parece que o Copom tem trabalhado com a hipótese que é mais demanda. Se continuarmos vendo PIBs mais fortes, sem grandes pressões inflacionárias, aí ele pode mudar de ideia”, diz Caruso.
Ricardo Jorge, especialista em renda fixa e sócio da Quantzed, no entanto, viu na Ata um discurso até mais brando com relação às preocupações internas do que no comunicado pós-decisão de juros. “A atividade segue forte. No entanto, o consumo das famílias desacelera, com o setor de serviços em processo de estabilização e o IPCA com uma dinâmica mais benigna com desaceleração dos núcleos, apesar de ainda estarem acima da meta”, comenta.
Para ele, a dinâmica é mais favorável para uma política monetária menos restritiva, mas o Banco Central segue cauteloso em afirmar que, pelo menos em 2023, ainda não se sente confortável em acelerar o ‘pace’ dos cortes para 0,75 p.p.
André Nunes de Nunes, economista-chefe do Sicredi, destaca outro ponto da Ata, que é a discussão sobre a discussão sobre a desancoragem das expectativas de inflação. “O Copom reconheceu que esse fato não decorre apenas das dúvidas quanto ao cumprimento das metas fiscais e desinflação global, mas de uma possível percepção, por parte de analistas, de que o Copom, ao longo do tempo, poderia se tornar mais leniente no combate à inflação”, ressalta
Comentários