Giulia Caruso e Paulo Peressin
Uma das mais recentes notícias do mundo jurídico ocorreu no fim de 2022, quando o STF aprovou a nova regra interna (Emenda Regimental 58/22) que impõe um prazo de 90 dias para que os Ministros apresentem voto ou devolvam o processo em casos de pedidos de vistas, sob pena de liberação automática do processo para julgamento.
Reflexo imediato dessa alteração de procedimento, e que repercutiu intensamente no último mês, foi o retorno da discussão acalorada sobre o julgamento das ADIn 1625/97 e ADC 39/15, que tratam sobre o decreto do presidente Fernando Henrique Cardoso cancelando à adesão do Brasil à Convenção 158, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em direta oposição ao Congresso Nacional. Essa discussão, segundo alardes inadvertidos, teria o potencial de operar profunda mudança no cenário das dispensas imotivadas, trazendo riscos para o empresariado.
Entretanto, existem outros assuntos há muito pendentes de julgamento no STF que merecem atenção. Separamos a seguir alguns os principais.
ADIn 4.067/08: discussão sobre repasse de contribuição sindical e filiação obrigatória às centrais sindicais.
O partido Democratas – DEM ajuizou ação requerendo, dentre outros pleitos, a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 589 e 593, da Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”), que possuem como objetivo o repasse de 10% da contribuição sindical arrecadada dos trabalhadores às centrais sindicais, sob o argumento de que as centrais sindicais não possuem como finalidade a defesa dos interesses de uma ou outra categoria, violando o intuito do artigo.
À época da primeira sessão, o Relator Min. Joaquim Barbosa proferiu voto que deu provimento parcial ao pedido, em voto que foi acompanhado pelos Ministros Lewandowski e Cezar Peluso. Os votos divergentes foram proferidos pelos Ministros Cármen Lúcia e Marco Aurélio, que julgaram improcedente a ação.
O processo encontrava-se, desde então, com pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes e, agora, foi incluído na pauta de julgamento de abril de 2023.
Ressaltamos que caso o entendimento do Relator prevaleça, os 10% atualmente designados para as centrais sindicais poderiam ser destinados à União. A retirada do direito ao repasse pode implicar em menos poder às centrais sindicais.
ADIn 5.994/18: invalidade de acordo individual escrito para a jornada 12×36.
O processo ajuizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde – CNTS pretende a declaração da inconstitucionalidade da expressão “acordo individual escrito” contida no caput e parágrafo único do art. 59-A da CLT, sob o argumento de reprovabilidade social, vez que restou desconsiderada a jurisprudência trabalhista sobre o tema. Vale ressaltar que o referido artigo autoriza que por meio de acordo individual escrito, empregador e empregado estabeleçam jornada 12×36, retirando dos sindicatos o domínio exclusivo deste tipo de negociação.
O Relator, Ministro Marco Aurélio, proferiu voto que julgava procedente o pedido da ADIn, entendendo a expressão “acordo individual escrito”, contido no art. 59-A, da CLT, como inconstitucional. O processo está suspenso em decorrência do pedido de vistas do Ministro Gilmar Mendes.
Assim, caso o entendimento registrado pelo Ministro Relator prevaleça, os acordos individuais prevendo jornada 12×36 não poderão mais ser realizados ou, a depender de eventual modulação dos efeitos da decisão, podem ser considerados nulos.
ADIns 6.050, 6.082 e 6.069: parâmetros trazidos na Reforma Trabalhista para indenização por danos morais.
Estes processos requerem a declaração da inconstitucionalidade dos arts. 223-A, 223-B e 223-G da CLT, que tabelaram e limitaram a fixação judicial da compensação pecuniária por dano moral.
O Relator, Ministro Gilmar Mendes, votou originalmente pelo provimento parcial dos pedidos, para conferir a interpretação de que: (i) as redações dos arts. 223-A e 223-B, da CLT, não impediam o direito à reparação por dano moral indireto ou danos em ricochete (i.e., reflexo) no âmbito das relações de trabalho – possibilitando novas discussões no âmbito cível. Ademais, o voto indicou de forma expressa que: (ii) os critérios de quantificação previstos no art. 223-G, da CLT, seriam orientativos e não impeditivos de arbitramento em valores superiores aos limites máximos indicados, conforme caso concreto e princípios do ordenamento jurídico.
O Ministro Nunes Marques pediu vista dos autos e o julgamento está suspenso desde então.
Caso o entendimento Relator prevaleça, os magistrados trabalhistas não estarão obrigados aos limites previstos na CLT, abrindo-se espaço para indenizações arbitradas de acordo com a análise subjetiva no caso concreto.
ADPF 488 e ADPF 951: responsabilização solidária sem inclusão de parte na sentença ou execução trabalhista.
Ações propostas pela Confederação Nacional do Transporte – CNT, tendo por objeto o conjunto de decisões da Justiça do Trabalho que “reconhecem responsabilidade solidária às empresas sucedidas, diante de simples inadimplemento de suas sucessoras ou de indícios unilaterais de formação de grupo econômico, a despeito da ausência de efetiva comprovação de fraude na sucessão e independentemente de sua prévia participação no processo de conhecimento ou em incidente de desconsideração da personalidade jurídica”.
O Relator, Ministro Alexandre de Moraes, negou seguimento à ação, por entender tratar-se do meio processual inadequado. Ato contínuo, a CNT interpôs recurso, ao qual foi negado provimento pelo Relator, bem como pelos Ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Edson Fachin, Cármen Lúcia, André Mendonça, Roberto Barroso, Luiz Fux e Nunes Marques. Entretanto, o Ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos no fim de 2022.
Este tema é de suma importância para a Justiça do Trabalho, dado o alto índice de responsabilização solidária sem que haja discussão prévia acerca da existência (ou não) de grupo econômico, comprovação de fraude ou conluio e, especialmente, sem a participação prévia nos autos do processo de conhecimento.
RE 960.429: competência da Justiça do Trabalho para julgar questões relativas à fase pré-contratual, em face de pessoa jurídica de direito privado integrante da Administração Pública.
O processo resume-se em verificar a quem compete processar e julgar demandas que tenham por objeto controvérsias relacionadas a concurso público realizado por pessoa jurídica de direito privado integrante da Administração Pública, durante a chamada fase pré-contratual ou pré-admissional.
O STF entendeu, inicialmente, pela competência da Justiça Comum, com base no argumento de que seria um ato de natureza administrativa e anterior à relação de emprego público, regida por contrato de trabalho, firmando assim o Tema de Repercussão Geral 992.
As partes opuseram diversos recursos que resultaram na suspensão do julgamento diante do pedido de vista do Ministro Nunes Marques, em 2021.
Giulia Caruso
Advogada da aréa trabalhista do Lefosse Advogados.
Lefosse Advogados
Paulo Peressin
Counsel da área trabalhista do Lefosse Advogados.
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