Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
Puxada pelos preços da comida, impulsionada pelo custo dos combustíveis e aquecida pelas confusões do governo, a inflação atingiu em novembro a taxa de 0,89%, a maior para o mês em cinco anos. Superou a previsão mais pessimista, de 0,85%, coletada no mercado pela Agência Estado. O primeiro impacto da pandemia, seguido pelo distanciamento social, anulou as pressões inflacionárias por três meses. A partir de junho, com a reação do consumo, os preços no varejo voltaram a subir, a princípio lentamente. Em seguida ganharam velocidade e aumentaram 0,64% em setembro e 0,86% em outubro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
São taxas incompatíveis com as metas e com os padrões vigentes no Brasil há alguns anos. Uma alta de preços de 0,64% em 30 dias pode parecer pequena ao observador menos informado. É um enorme engano. Acumulada em 12 meses, essa taxa resultaria numa inflação de 7,96%, uma enormidade em qualquer economia razoavelmente organizada.
O Brasil talvez esteja longe de um problema desse tamanho, mas ninguém deve desprezar o risco de um desarranjo nos preços. Se a inflação de outubro, de 0,86%, se repetir em dezembro, a meta oficial de 4%, válida em 2020, será ligeiramente superada, com um resultado efetivo de 4,02%. Acima e abaixo da meta há um espaço de tolerância de 1,5 ponto porcentual, mas a questão mais importante, neste momento, vai muito além desse detalhe.
A inflação acelerou-se desde junho, com um recuo registrado só em agosto, e é razoável perguntar se os números crescentes indicam uma tendência. No mercado, a mediana das projeções passou a apontar uma inflação de 4,21% em agosto, segundo a pesquisa Focus divulgada ontem pelo Banco Central (BC). Quatro semanas antes essa mediana correspondia a 3,20%.
Com a piora das expectativas, mais economistas passaram a apostar num resultado final, em 2020, acima do chamado centro da meta. Mas a pesquisa mostra – e este é um dado positivo – a esperança de uma acomodação no próximo ano, com o IPCA subindo 3,34%. Mas esse número ainda é superior ao de quatro semanas antes (3,17%).
As expectativas são importantes para a determinação dos juros. Por isso, afetam o financiamento da dívida pública, a saúde das contas de governo e o crédito para as famílias e para as empresas. Afetam, portanto, as possibilidades e o ritmo de recuperação da economia nacional e da criação de empregos.
A aceleração da inflação, muito clara nos últimos meses, levou os economistas do mercado a piorar as projeções para o ano, admitindo até uma superação da meta oficial. Também as projeções para 2021 foram contaminadas, mas com a projeção mediana ainda abaixo da nova meta, de 3,75%. Mas também essa projeção poderá mudar, se os preços continuarem fora dos padrões aceitáveis para o Brasil.
A inflação acumulada no ano, até novembro, chegou a 3,13%. Em 12 meses bateu em 4,31%, taxa superior à meta para o período de janeiro a dezembro. Se tudo correr bem, o balanço final será melhor, embora ainda haja fortes pressões.
Com os consumidores cautelosos, só uma pequena parcela dos aumentos no atacado tem sido repassada ao varejo. Mas o repasse tem afetado de modo sensível os preços finais. Os mais prejudicados têm sido os consumidores de menor renda, porque a alimentação tem maior peso em seu orçamento. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), baseado no consumo de famílias com renda salarial de um a cinco salários mínimos, subiu 0,95% em novembro, 3,93% no ano e 5,20% em 12 meses.
Mas o encarecimento da comida é só a face mais ostensiva da inflação. Outros preços também têm subido, e isso inclui os monitorados, como os da gasolina, do gás de botijão e da água e esgoto. O custo da alimentação tem sido em parte influenciado pelo mercado externo, mas a cotação do dólar, muito alta na maior parte do ano, também tem afetado os preços. As confusões do governo e as incertezas sobre as contas públicas em 2021 têm sido importantes fatores de instabilidade cambial e, portanto, de inflação.
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