O assédio cometido com o uso de apelidos jocosos em ambiente profissional configura mais do que mero aborrecimento e se insere no âmbito da lesão ao direitos de personalidade do trabalhador.
Com esse entendimento, a 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) determinou que uma siderúrgica de Minas Gerais pague uma indenização total de R$ 70 mil, por danos morais decorrentes do acidente de trabalho e do assédio dos colegas, a um ex-empregado que perdeu parte dos dedos da mão direita em acidente na empresa e passou a ser apelidado de “Cotoco” e “Cotó”.
O acidente de trabalho aconteceu em agosto de 2008, durante o serviço de movimentação de carga. O profissional, que exercia na empresa a função de supervisor de montagem, colocou a mão direita sob o equipamento chamado virola, prensando os dedos entre a máquina e a base de apoio. A perícia apontou sequelas permanentes de traumatismo da mão direita, redução da capacidade laborativa avaliada em 23,25%, de acordo com a tabela da Susep, e prejuízo estético, sendo considerado apto para o trabalho.
Uma testemunha ouvida contou que, após o ocorrido, os gestores não tratavam o trabalhador da mesma forma. “Ele recebeu apelidos (Cotó e Cotoco), mas não levava bem essa situação. Os colegas que chamaram com tais apelidos estavam hierarquicamente acima e abaixo.”
Outra testemunha afirmou que o supervisor nunca aceitou os apelidos e detalhou que era o “chão de fábrica” que desrespeitava o trabalhador. Ele negou que a culpa do acidente tenha sido do autor da ação, informando que já foram registrados outros acidentes nessa máquina, com o mesmo tipo de sequela.
O caso foi decidido em primeiro grau pelo juízo da 4ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano (MG), que garantiu ao trabalhador as indenizações. Mas ele interpôs recurso pedindo a majoração do valor arbitrado a título de danos morais pelo tratamento desrespeitoso dos colegas de trabalho em decorrência dos danos estéticos.
Já a empregadora argumentou, na defesa, que orientou corretamente o empregado sobre a atividade desempenhada e que forneceu os EPIs. Alegou ainda que “não há evidência que leve a crer que a parte recorrida esteja incapacitada ao trabalho ou possua as lesões indicadas”.
Para o desembargador-relator, Antônio Carlos Rodrigues Filho, não há dúvida acerca do dano e do nexo causal entre o evento danoso e a atividade laboral exercida pelo profissional. Segundo o magistrado, trata-se de acidente de trabalho típico, nos termos do artigo 19 da Lei 8.213/1991.
O trabalhador informou que, após a perícia feita em 2017, ocorreu uma piora psicológica. Ele contou que não queria sair de casa e chegou a tentar o suicídio, em 2018. Atualmente, o ex-supervisor encontra-se em tratamento psiquiátrico e está aposentado por invalidez desde 2021.
Ao proferir seu voto, o desembargador acatou o laudo pericial que apontou a inexistência de nexo de causalidade entre as doenças de ordem psíquica que afetam o reclamante e o trabalho desempenhado. Para o julgador, ficou evidenciada a ausência do nexo causal, “tendo outras causas sem qualquer relação com o trabalho”.
Porém, segundo o magistrado, mesmo que não tenha levado ao adoecimento mental do autor, o fato é que o assédio moral ficou evidenciado nos autos, sobretudo pela prova oral produzida. “A chacota, a zombaria e o menoscabo sofridos de forma reiterada superam o status de mero aborrecimento para se inserir na esfera de lesão aos direitos de personalidade.”
Para o magistrado, não há como se afastar das conclusões do juízo da 4ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano quanto à existência do acidente de trabalho e o dano moral sofrido pelo empregado em dois momentos distintos: o primeiro, decorrente do próprio acidente, presumido; e o segundo, em razão do tratamento dispensado pelos colegas de trabalho.
O julgador entendeu que deve ser mantido também o entendimento da sentença em relação aos danos materiais. “Documento anexado aos autos não comprova quaisquer gastos por parte do trabalhador, o que é essencial para a procedência do pedido, cujo caráter é reparatório”.
Assim, diante da evidente gravidade dos fatos narrados, sobretudo quanto à intensidade do sofrimento e da humilhação sofridos e o grau de culpa da empresa, o relator majorou o valor arbitrado à indenização pelo acidente de trabalho, de R$ 30 mil para R$ 50 mil, e pelos danos morais, de R$ 15 mil para R$ 20 mil, em razão do tratamento dispensado pelos colegas, sendo seguido pelos demais integrantes do colegiado de segundo grau. O processo foi remetido ao Tribunal Superior do Trabalho para análise do recurso de revista.
Com informações da assessoria de comunicação do TRT-3.
Revista Consultor Jurídico
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