“Treinamento é custo, não investimento”. Esse tipo de afirmação é um clássico no rol de equívocos de modelos de negócios em que a folha de pagamento é a maior despesa da operação, entre eles o varejo de alimentos, porque ainda reflete o passado. “Falta conscientização de uma parte dos empresários do setor em relação ao atendimento, que é um aspecto importantíssimo para fidelizar o cliente e fazê-lo comprar na minha loja e não no concorrente”, diz Frederico Gorgulho, diretor da Leitura Z Treinamento para Supermercados e Varejo.
Para o especialista, os erros mais frequentes nessa área ainda são reflexo do entendimento de que se eu treino o colaborador e ele sai da empresa, o esforço e o investimento foram desperdiçados. “Isso faz parte. O que ele aprendeu levará com ele. Conhecimento é aquilo que se adquire, se multiplica e ainda assim fica com a gente para sempre”, diz Gorgulho. “Trata-se de um conjunto, formado por aprendizado, motivação, engajamento, plano de carreira, ambiente de trabalho legal, uma boa liderança, que vai estimular o colaborador a colocar em prática o que aprendeu e permanecer na empresa.”
Trunfo dos pequenos – Dizer que o bom atendimento é um diferencial para qualquer empreendimento é um clichê, mas quando se analisa o pequeno varejista, isso se torna um trunfo, já que as grandes possuem uma forma engessada de tratar o cliente. “O pequeno me atende como eu, ‘o cliente’, quero. Ele corta a carne como eu gosto, empacota como eu preciso. Não raro há consumidores que procuram sempre a mesma operadora de caixa. Pode até ter outro check-out vazio, mas ele quer aquela, que dá atenção, é gentil. No varejo de alimentos isso é ainda mais evidente”, explica o professor Gorgulho.
Segundo o consultor, há redes de grande porte que fazem o treinamento “receita de bolo” e esquecem que o cliente de Manaus é de um jeito, o de Salvador de outro, que é diferente do de Porto Alegre. O atendimento tem que ser regionalizado e também personalizado, porque vai muito além da parte humana.
“Considero que hoje não existe mais PDV (ponto de venda) e sim PDX, ou ponto de venda somado à experiência de compra, ou seja, uma ruptura é um mau atendimento, assim como um carrinho perdido e, claro, uma interação insatisfatória, porque tudo influi na experiência de compra”, reforça.
Gorgulho chama a atenção para a transformação rápida que a pandemia causou na maioria dos equipamentos de varejo, em relação à digitalização, e que exigiu de muitos pequenos se reinventarem para sobreviver. “Apesar disso, o boca a boca ainda é importante, ainda mais para uma geração mais madura, que valorização a indicação”, ressalta.
Com as redes sociais em destaque e acessíveis a uma enorme parcela da população, pelo smartfone, é preciso ainda mais cuidado com a forma de atender. O consultor cita o caso de uma rede em que uma influenciadora digital foi mal atendida e a cliente acabou publicando o relato da experiência na internet, o que prejudicou a imagem do mercado.
“A presença digital, estratégias de preços, clubes de compra são iniciativas legais, mas uma boa equipe de atendimento ainda fideliza tanto ou mais os clientes que essas ações”, destaca Gorgulho.
Imagine duas cenas. Na primeira, você se aproxima de um repositor no mercado e pergunta se tem um determinado produto. A resposta é um seco ‘não’ e imediatamente ele retoma a tarefa que estava fazendo. Segunda cena: você chega em outra loja e consulta um funcionário sobre o mesmo produto. Ele informa que está em falta, mas que há outro, com a mesma qualidade, e ainda outra opção, em promoção. Qual dessas abordagens lhe deixaria uma boa recordação?
Para Gorgulho, é preciso transformar o repositor, o atendente, o balconista do açougue ou de frios em vendedores consultivos. “O consumidor levará mais que apenas o produto que precisava, comprará outros que nem lembrava. O produto X acabou, mas tem esse aqui. Qual a sua receita? Precisa de uma bebida para acompanhar? Esses são exemplos dessa nova postura, que precisa ser incentivada”, diz o consultor.
“Não esqueçamos que motivação significa motivar uma ação, ou seja, o empregado precisa estar engajado, ter um propósito, um estímulo, que também precisa vir de dentro, para prestar um bom atendimento. Quanto melhor o ambiente, melhores serão os resultados”, completa Gorgulho.
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