Sabemos que hoje no Brasil, empreender, definitivamente, não é para amadores, em especial, aos empreendimentos do setor Supermercadista. Pois, além de todos os desafios na condução do negócio, como a obtenção das licenças de funcionamento obrigatórias, o excesso da carga tributária, os desafios trabalhistas, os problemas com os fornecedores. Ainda, há uma série de legislações que os Supermercados precisam observar, dentre elas destaca-se o Código de Defesa do Consumidor.
Sobre o tema, vale salientar que o Procon é órgão legitimado para fiscalizar e lavrar auto de infração contra Supermercados, quando identificar alguma afronta aos direitos dos consumidores. Aqui, no Mato Grosso do Sul, não é diferente, basta um simples clique nas páginas eletrônicas do Procon Estadual de Mato Grosso do Sul e do Procon Municipal de Campo Grande, que encontraremos notícias acerca de algum empreendimento que sofreu alguma fiscalização das respectivas autarquias.
Contudo, importante enfatizar, que mesmo que exista alguma irregularidade ao Código de Defesa do Consumidor, o Auto de Infração a ser lavrado pelo Procon (Estadual ou Municipal) deve respeitar o art. 35, I do decreto 2.181/97, que determina as informações que devem estar contidas no auto de infração.
Assim, como é possível observar, há uma série de indicações que devem obrigatoriamente constar no documento, por essa razão é importante uma correta análise de todas as informações presentes no Auto de Infração recebido pelo Supermercado, pois a ausência de algum dos itens pode gerar a nulidade do AI.
Outro ponto que também deve ser observado, é se consta na notificação o prazo para apresentação de defesa no auto de infração, pois tal obrigação está expressa no art. 42 também do decreto 2.181/97.
Inclusive a ausência de notificação para apresentação de defesa administrativa, afronta os princípios do contraditório e ampla defesa, implicando na nulidade do processo administrativo do Procon e consequentemente da multa aplicada, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Vejamos:
RECURSO DE APELAÇÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – MULTA APLICADA PELO PROCON/MS – NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR AFRONTA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA – AUSÊNCIA DE PRÉVIA INTIMAÇÃO DA EMPRESA RECLAMADA QUANTO AO ALEGADO DESCUMPRIMENTO DE ACORDO FIRMADO NO PROCESSO ADMINISTRATIVO – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. É nulo ato administrativo – consistente em aplicação de multa pelo PROCON – quando deixa de oportunizar o prévio exercício do contraditório e da ampla defesa da empresa reclamada no que tange à suposto descumprimento de acordo firmado na via administrativa, culminando com a respectiva invalidação dos respectivos atos decorrentes, tais como auto de infração, multa e certidão de dívida ativa.
(TJ/MS. Apelação Cível 0841780-78.2017.8.12.0001, Campo Grande, 2ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Marco André Nogueira Hanson, j: 19/11/19, p: 28/11/19)
Claro, que os Supermercados sempre buscam o cumprimento das obrigações previstas pelo Código de Defesa do Consumidor. Contudo, no caso de eventual fato isolado que afronte o CDC, é importante que a multa aplicada pelo Procon, cause o menor impacto possível ao faturamento da loja. Portanto, é de extrema importância a correta análise acerca da apresentação ou não do faturamento do Supermercado ao Procon.
Dessa forma, no momento do recebimento da notificação de apresentação de defesa administrativa, também devemos observar se foi concedido prazo para apresentação do faturamento do Supermercado. Pois, um dos fatores que deve ser analisados no momento de fixar a multa, é a condição econômica do infrator, conforme determina o art. 28 do decreto 2.181/971, em outras palavras, é a partir do respectivo faturamento que haverá o enquadramento do porte econômico do Supermercado.
Assim, buscando demonstrar a relevância da presente análise, vale mencionar que em Mato Grosso do Sul o valor atual do UFERMS é de R$ 47,40 (quarenta e sete reais e quarenta centavos), conforme Resolução /SEFAZ 3.317 de 17 de abril de 20232. Dessa forma, após a informação acima, vejamos como é calculada a PBI (pena base inicial) da multa a ser aplicada pelo Procon Estadual de Mato Grosso do Sul em caso de afronta ao CDC, conforme determina o decreto Estadual 15.647 de 08 de abril de 2021:
Art. 45. A PBI será fixada de acordo com o caso concreto, respeitando-se o disposto no art. 57 do Código de Defesa do Consumidor, segundo os critérios mínimos abaixo:
I – Profissional qualificado nos termos do parágrafo único do art. 966, do Código Civil (lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002): 50 UFERMS;
II – Microempreendedor Individual (MEI): 35 UFERMS;
III – Microempresa (ME): 100 UFERMS;
IV – Empresa de Pequeno Porte (EPP): 150 UFERMS;
V – demais empresas: 200 UFERMS.
Portanto, ao analisar o que dispõe a legislação, conseguimos identificar que há uma grande relevância na classificação do porte econômico do Supermercado. Pois como indicado acima, é a partir do enquadramento do porte da loja que teremos o valor da PBI (Pena Base Inicial), que será utilizada para o cálculo da multa. Dessa maneira, buscando elucidar as informações contidas nas legislações indicadas acima, segue abaixo gráfico indicativo do valor da PBI frente ao porte econômico da empresa:
(Imagem: Divulgação)
Indicação do valor da Pena Base Inicial frente ao porte do Supermercado.
Como é possível perceber, a correta análise da apresentação ou não do faturamento do Supermercado é importante para resguardar a renda da loja. Pois, se é possível classificar a loja como “Microempresa” ou “Empresa de Pequeno Porte” e ter uma PIB (Pena Base Inicial) no valor próximo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por qual razão a loja deve correr risco de ser classificada como “Demais Empresas” e ter a PIB (Pena Base Inicial) perto do valor de R$ 10.00,00 (dez mil reais)?
Destacamos, que os valores indicados acima, se referem à pena base inicial, assim, o valor ainda será multiplicado pela gravidade da infração, sendo possíveis de agravamento e atenuantes previstas na legislação. Assim, uma infração por divergência de preço entre gôndola e caixa, em Mato Grosso do Sul, pode facilmente chegar a valores próximos a casa dos R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Vale ressaltar ainda, que os valores indicados acima, se referem ao Procon de Mato Grosso do Sul. Contudo, também é possível realizar a mesma análise com relação aos valores, para as multas aplicadas pelo Procon Estadual de São Paulo.
Assim, buscando ilustrar, utilizando a mesma irregularidade de divergência de preço entre gôndola e caixa, supondo que o faturamento real do supermercado seja de R$ 2.5 milhões de reais por mês e o Procon/SP tenha estimado o seu faturamento em R$ 10 milhões, teríamos uma divergência gigantesca no valor da multa aplicada, com sabe na Portaria Normativa nº 229 de 22 de dezembro de 20223. Vejamos:
(Imagem: Divulgação)
Comparação do valor da muta do Procon, frente ao faturamento do Supermercado.
Dessa forma, é de fácil compreensão que uma multa com valor acima de R$ 100 mil reais, certamente irá gerar um forte impacto negativo no faturamento do supermercado. Contudo, no gráfico acima, é possível que essa mesma multa, seja reduzida para o valor de R$ 28 mil reais, gerando uma economia ao supermercado de mais de R$ 70 mil reais.
Lembrando, que estamos falando apenas de questões técnicas para auxiliar e minimizar o valor de eventual aplicação de multa pelo Procon. Assim, além das questões indicadas acima, ainda é possível discutir a própria fundamentação do órgão ao justificar a suposta infração cometida pela loja e pleitear aplicações de atenuantes.
Assim, diante de um setor aonde a margem de lucro é extremamente reduzida, a correta análise do auto de infração e da notificação para apresentação de defesa administrativa, são fortes aliados para minimizar os prejuízos provocados pelas multas aplicadas pelo Procon no faturamento dos Supermercados.
Portanto, importante contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada, capaz de auxiliar a loja nos processos de análise e tomada de decisão junto aos processos. Afinal, também precisamos garantir que o direito dos Supermercados seja respeitado nas relações de consumo.
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1 BRASIL. Decreto 2.181, de 20 de março de 1997. Dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, estabelece as normas gerais de aplicação das sanções administrativas previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, revoga o Decreto Nº 861, de 9 julho de 1993, e dá outras providências. [S. l.], 21 março 1997. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2181.htm. Acesso em: 28 abr. 2023
2 MATO GROSSO DO SUL. Resolução/SEFAZ 3.317, de 17 de abril de 2023. Estabelece o valor da UFERMS para o mês de maio de 2023. [S. l.], 24 abr. 2023. Disponível em: http://aacpdappls.net.ms.gov.br/appls/legislacao/serc/legato.nsf/e5c724b4c70cb1da04256b1f005348a8/c3c217378f5d811e0425899b00494d19?OpenDocument. Acesso em: 28 abr. 2023.
3 SÃO PAULO. Portaria Normativa 229, de 22 de dezembro de 2022. Dispõe sobre a atividade fiscalizatória e o processo administrativo sancionador no âmbito da Fundação PROCON, bem como sobre a utilização do Sistema PROCON-SP DIGITAL na forma que especifica e dá outras providências. [S. l.], 23 dez. 2022. Disponível em: https://www.procon.sp.gov.br/wp-content/uploads/2022/12/PORTARIA-NORMATIVA-229-2022-INSTITUI-O-CODIGO-DE-PROCEDIMENTOS-FISCALIZATORIOS-E-SANCIONATORIOS-NA-FUNDACAO-PROCON.pdf. Acesso em: 28 abr. 2023.
Juan Lucas Fonseca Pinheiro
Sócio do escritório Mascarenhas Barbosa Advogados.
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