Governo traça cenário favorável pós-reforma. Mas há ansiedade por um ‘algo mais’ a curto prazo.
Já está no Congresso a proposta para reforma da Previdência, sujeita a pressões e contrapressões, conforme era de se esperar. Começa agora um longo trajeto, que põe à prova não só a comunicação e a articulação política do governo, como também o entusiasmo inicial dos mercados, dos setores produtivos e de especialistas. E o chamado cidadão comum? Tem noção de que a aposentadoria vai demorar. Mas ainda espera baixar a poeira dos debates contaminados pela polarização política, para fechar sua opinião sobre perdedores e ganhadores com as mudanças na Previdência.
Enquanto isso, sua preocupação imediata continua sendo a conquista de mais e melhores empregos. O que não parece estar no horizonte a curto prazo. Por essa razão, a expectativa agora é de uma atuação específica do governo pró-crescimento. Mesmo quem elegeu Bolsonaro sabendo que a prosperidade não viria de um dia para outro mantinha a esperança de que alguma coisa seria feita logo para apressar o cumprimento desse objetivo. Destravar as contas públicas com uma reforma da Previdência o mais vigorosa possível é essencial, mas talvez não seja suficiente para isso.
No meio do turbilhão político que envolveu o governo Bolsonaro e com todas as atenções voltadas para a Previdência, alguns analistas talvez estejam deixando em segundo plano o real estado da atividade econômica para montar seus cenários para o ano. É como se, de imediato, a reforma da Previdência fosse capaz de eliminar todos os obstáculos e, por si só, garantisse um crescimento acelerado.
O Produto Interno Bruto (PIB) de 2018 ainda não é conhecido, mas as projeções oficiais já estão em 1,3%. Tanto o monitor do PIB, da FGV, como o Índice da Atividade Econômica do Banco Central, o IBC-Br, apontam uma alta de 1,1% em 2018, Para 2019. As apostas dos mercados concentram-se em 2,5%.
A face mais visível dessa economia ainda fraca é o desemprego, que continua em queda, mas uma queda lenta demais para a ansiedade geral. Segundo o IBGE, só 6 das 27 unidades da Federação registraram queda no desemprego do terceiro para o quarto trimestre de 2018, período em que a taxa consolidada passou de 11,9% para 11,6% da força de trabalho, e mais de 5 milhões de pessoas estão em busca de uma ocupação há um ano ou mais. A chamada taxa de subutilização da força de trabalho resiste nas vizinhanças de um quarto desse universo, o que corresponde a quase 27 milhões de pessoas.
Verdade que, dada a velocidade dos acontecimentos no governo Bolsonaro, 2018 parece muito longe. Mas o fato é que os números fechados do ano indicam o ponto onde a economia se encontra e, mais importante, o esforço que precisaria ser feito para erguê-la daí com maior rapidez.
Os indicadores de confiança de empresários e consumidores, medidos pela FGV, mantêm-se favoráveis, mas já exibem um certo descompasso: enquanto a confiança dos empresários continua em alta, refletindo as expectativas principalmente em relação à Previdência, os consumidores já baixaram um pouco aquela euforia pós-eleitoral.
Não é da natureza da atual equipe econômica recorrer a medidas para anabolizar o consumo – nem seria aconselhável, tendo em vista a frustração de experiências anteriores. Mas seria apropriado, atendendo inclusive às promessas de campanha, buscar algumas saídas que funcionariam como emergenciais, a exemplo de tirar do chão obras públicas paradas. Além disso, fala-se em alguma ajuda aos Estados sob risco de quebra, principalmente como moeda de troca para conseguir o engajamento de seus governadores na reforma da Previdência. O que pode representar um alívio para funcionários em situação de penúria e para os negócios da região, embora não seja um instrumento poderoso para fortalecer a economia.
Segundo estudo do Ministério da Economia, dentro da campanha pró-reforma da Previdência, sem a aprovação da proposta do Planalto o crescimento do PIB deste ano poderá cair para abaixo de 1% e, no segundo semestre de 2020, o País poderá entrar em nova recessão. O roteiro é conhecido: finanças públicas mais deterioradas, juros mais altos e atividade econômica mais baixa. Com a reforma, o crescimento chegaria a 2,9% neste ano e no ano que vem, subindo para 3,3% em 2023. Em termos de empregos, seriam criados 8 milhões de postos até 2023.
Porém, por mais eloquentes que sejam esses números, não escondem a realidade do curto prazo. Até que o círculo vicioso dê lugar a um círculo virtuoso, é preciso fazer algo mais. E esse “algo mais”, sem desrespeitar o receituário liberal, é um novo e grande desafio para a equipe econômica de Bolsonaro. CIDA DAMASCO É JORNALISTA
Cida Damasco, O Estado de S.Paulo
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