Adriana Ferraz e Pedro Venceslau, O Estado de S.Paulo
O cenário da disputa presidencial foi intensamente movimentado nesta quinta-feira, 31, com uma manobra do ex-governador de São Paulo João Doria para garantir o que chamou de “apoio explícito” do PSDB à sua pré-candidatura e com a desistência de Sérgio Moro, que trocou o Podemos pelo União Brasil, abrindo mão, “neste momento”, de disputar o Palácio do Planalto.
No dia marcado para sua renúncia ao governo do Estado, Doria surpreendeu aliados ao informar que permaneceria no Palácio dos Bandeirantes. Ele retomou o projeto presidencial horas depois, após o presidente nacional da legenda, Bruno Araújo, enviar uma carta aos principais líderes do partido garantindo apoio à sua candidatura. “Sim, serei candidato à Presidência da República e pelo PSDB. Teremos um novo Brasil”, afirmou, em referência indireta às especulações de que poderia sair do partido.
Durante pronunciamento feito no Palácio dos Bandeirantes precedido de gritos de “Brasil, à frente, Doria presidente”, e de uma bateria de escola de samba, o tucano fez críticas aos governos do PT e à gestão de Jair Bolsonaro e disse que a pressão dos “extremistas” tem dificultado a construção de um consenso para confrontar os erros do petismo e do bolsonarismo.
A saída de Moro animou líderes políticos envolvidos em uma articulação pela concentração da terceira via. Sem apoio no Podemos, o ex-juiz da Operação Lava Jato foi recebido no União Brasil com reticências. A ala ligada ao ex-prefeito de Salvador ACM Neto condicionou o ingresso de Moro ao partido ao abandono da pretensão de disputar o governo federal. O ex-juiz mudou o domicílio eleitoral do Paraná para São Paulo e deverá ser candidato a deputado federal.
Numericamente, o ex-juiz é quem aparece nas pesquisas em melhor posição entre os pré-candidatos do centro. No mais recente levantamento do Datafolha, Moro somou 8% das intenções de voto nos cenários pesquisados, atrás do ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva (43%) e do presidente Jair Bolsonaro (26%), do PL. No mesmo levantamento, Doria registrou 2%.
No caso do tucano, a avaliação entre adversários e até aliados é de que ele esgarçou ainda mais a relação com a direção do PSDB, aprofundou a divisão interna e continuará sofrendo forte resistência na legenda. Falando já como ex-governador após seu discurso de despedida, Doria disse que as notícias sobre sua desistência pela Presidência foram uma “estratégia política”. Segundo ele, houve um planejamento prévio para que Araújo tivesse de se manifestar publicamente em apoio a seu nome.
Mas dois fatores foram determinantes para a arriscada jogada política do tucano. A primeira foi a desconfiança em relação a quadros que deveriam estar na linha de frente de sua pré-campanha: além de Araújo, o então vice-governador (e agora governador) Rodrigo Garcia, que foi escolhido em prévias o pré-candidato do PSDB ao governo paulista.
Segundo um aliado próximo a Doria, Garcia despertou desconfiança ao manter pontes com a ala tucana alinhada ao gaúcho Eduardo Leite – que perdeu as prévias nacionais, mas se mantém como opção no partido para a disputa ao Planalto. Nesta quinta-feira, Leite formalizou a renúncia ao governo do Rio Grande do Sul sem abandonar o discurso de pré-candidato. “É cedo para dizer o que as próximas semanas me reservam”, destacou. “Mas posso dizer que esse percurso vai ser coletivo.”
Havia também o temor no Palácio dos Bandeirantes de que Garcia abandonasse Doria assim que assumisse o cargo. Sem a retaguarda da máquina paulista, do partido e do seu sucessor, o presidenciável ficaria mais vulnerável. Em relação a Araújo, Doria, que nunca confiou no dirigente, percebeu que sua pré-candidatura presidencial seria sufocada financeira e politicamente. Um sinal da falta de recursos foi a saída do marqueteiro Guilherme Raffo da pré-campanha. Doria tem minoria na executiva nacional do PSDB, que conta com 32 integrantes.
Em entrevista coletiva após o anúncio, Doria disse que “não houve desistência” da pré-candidatura ao Planalto, mas sim um “planejamento” para se manter na disputa pelo Planalto. “Houve sim um planejamento para que pudéssemos ter aquilo que conseguimos, o apoio explícito do PSDB a partir de seu presidente, Bruno Araújo. A carta que ele assinou hoje não deixa nenhuma dúvida nem agora nem depois”, disse.
“O PSDB elegeu, em processo democrático das prévias, um. Esse é o candidato, não tem dúvida, não há questionamento, não dá golpe possível em uma democracia. Ela tem de ser obedecida e hoje ficou claro, através dessa carta do presidente nacional, Bruno Araújo, que não há forma de se negar o resultado das prévias. Isso seria admitir que o PSDB se tornou um partido golpista e o PSDB não é um partido golpista.”
Na carta assinada por Bruno Araújo, o presidente do partido afirmou que a vaga de presidenciável do PSDB está assegurada a Doria e mais, que a legenda começará a colocar recursos em seu plano. Mas até os aliados mais próximos consideraram a jogada arriscada, especialmente na relação futura com seu vice, Rodrigo Garcia, que, ameaçado de traição, cogitou trocar o PSDB pelo União Brasil ou mesmo desistir de se lançar à sucessão de Doria. Coincidência ou não, o recuo foi vazado depois de anúncio feito pelo ex-juiz Sérgio Moro.
Para Felipe d’Avila, pré-candidato do Novo ao Palácio do Planalto, com a renúncia de Moro e a candidatura de Doria, “a terceira via ainda terá de ser depurada antes de ser unida”. “A alta rejeição era um problema para o Moro e é um problema para o Doria”, afirmou d’Avila ao Estadão. “A rejeição impõe um limite ao crescimento do candidato. E eles enfrentam a pressão dos pré-candidatos a deputado federal para abrir mão de suas candidaturas em razão dos recursos disponíveis do fundo eleitoral.”
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