10 de setembro, 2024

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Estabelecimento empresarial que funciona aos domingos. Atividade de assistência à saúde. Escala quinzenal de revezamento. Proteção ao mercado de trabalho da mulher. ART. 7º, XX, da CF, e ART. 386 da CLT

A discussão consiste em saber se é absoluta a previsão de o descanso semanal remunerado coincidir com o domingo, na hipótese do trabalho da mulher. A coincidência preferencial do descanso semanal com o domingo sempre foi enfatizada pela ordem justrabalhista. A CLT já estabelecia (art. 67), a Lei n. 605/49 a reiterou (art. 1º), e a Constituição de 1988 determinou-a expressamente (art. 7º, XV). A coincidência, contudo, é preferencial , e não absoluta . Há empresas autorizadas a funcionar em domingos (desrespeitando, pois, licitamente, essa coincidência preferencial). Tais empresas deverão, porém, organizar uma escala de revezamento entre seus empregados, de modo a permitir a incidência periódica em domingos de um descanso semanal remunerado . Nessa escala de trabalho e folgas, é preciso que se respeite a coincidência preferencial com os domingos, determinada pela Constituição. O comércio em geral , embora não configure – em seu todo – atividade que, por sua natureza ou pela conveniência pública, deva ser exercida aos domingos (parágrafo único do art. 68 da CLT), passou a ser favorecido pela possibilidade de elidir a coincidência preferencial enfatizada pela ordem jurídica . Desde a MP n. 388, de 2007 (convertida na Lei nº. 11.603/2007), a escala de coincidência dominical foi aperfeiçoada , devendo o descanso semanal remunerado coincidir com o domingo ao menos uma vez no período máximo de três semanas. É, pois, o que prevalece no art. 6º, caput e parágrafo único, da Lei nº 10.101/2000 . Não se desconhece que o art. 6º da Lei nº 10.101/2000 consiste em norma jurídica especial – trabalhadores do comércio em geral -, regente de um segmento especial de trabalhadores. Não se trata de uma norma geral que, necessariamente, não tenha a aptidão de se confrontar com norma especial previamente divulgada. Não obstante, o legislador excepcionou expressamente, da Lei nº 10.101/2000, as mulheres que trabalham aos domingos, elevando o art. 386 da CLT, inserido no Capítulo III, que trata da Proteção do Trabalho da Mulher, à categoria de legislação especial. Nesse contexto de proteção especial ao mercado de trabalho das mulheres prevista na Constituição Federal de 1988, além do art. 7º, XX, da CF/88, existem disposições que garantem um núcleo protetivo de direitos fundamentais sociais das mulheres e legitimam tratamento diferenciado em relação aos homens, como o art. 5º, I, que estabelece o princípio da igualdade, o art. 7º, XVIII, que prevê a licença-maternidade de 120 dias, e o art. 226 , que valoriza a instituição familiar. Além disso, diversas normas buscam garantir um padrão moral e educacional adequado para crianças e adolescentes, como evidenciado no art. 227 da CF/88. De par com isso, qualquer situação que envolva efetivas considerações e a máxima efetividade das normas constitucionais permite tratamento normativo diferenciado, à luz de critério jurídico valorizado pela própria Constituição da República. Assim, por força do critério da especialidade (conforme o art. 2º, § 2º, da LINDB) e do princípio da norma mais favorável, deve prevalecer o império do art. 386 da CLT em favor das mulheres que se ativam no comércio aos domingos , a fim de garantir não apenas o descanso, mas também o convívio da mulher com sua família, parentes e amigos, já que, em regra, desfrutam de folgas também aos domingos. Cumpre mencionar também a tese consagrada pelo Tribunal Pleno desta Corte na apreciação da inconstitucionalidade do art. 384 da CLT. Conforme Incidente de Inconstitucionalidade em Recurso de Revista IIN-RR-1540/2005-046-12-00.5, o art. 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal. Por analogia, o mesmo entendimento deve ser aplicado ao art. 386 da CLT . Nesse sentido, os recentes julgados da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais e das Turmas do TST. Outrossim, reafirmando a importância da escala de revezamento quinzenal, a Lei nº 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, não trouxe alterações ao texto do art. 386 da CLT. É válido ressaltar também que o não cumprimento do intervalo estabelecido no art. 386 da CLT não acarreta apenas penalidades administrativas, mas também implica o pagamento de horas extras correspondentes a esse período. Isso se deve ao fato de que a medida prevista nesse artigo está relacionada à higiene, saúde e segurança do trabalhador. Portanto, com base nos fatos apresentados no acórdão regional, há uma clara violação ao art. 386 da CLT pela Reclamada. Essa conduta empresarial importa no desrespeito à exigência legal da escala quinzenal de revezamento, causando um prejuízo manifesto à trabalhadora, que teve sua convivência familiar e comunitária parcialmente prejudicada. Harmonizando-se, portanto, a decisão recorrida com a jurisprudência atual, notória e reiterada desta Corte, o apelo revisional não se viabiliza, restando incólumes os dispositivos tidos por violados e irrelevantes os arestos colacionados. Inteligência do §7º do art. 896 a CLT e da Súmula 333/TST. Agravo de instrumento desprovido” TST (AIRR-957-09.2022.5.12.0054, 3ª TURMA, RELATOR MINISTRO MAURICIO GODINHO DELGADO, DEJT 28/06/2024).

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