19 de maio, 2024

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Evitar quebradeira, desafio imediato

Notas & Informações, O Estado de S.Paulo

Sair do buraco será mais fácil, depois da crise, se o governo conseguir evitar uma quebradeira e uma nova devastação do emprego. Metade das grandes empresas poderá enfrentar até três meses sem receita, mas boa parte das micro, pequenas e médias mal consegue, sem vendas, sobreviver 30 dias. Quase 40% das grandes poderão ficar sem caixa no segundo mês. Os cálculos são do Centro de Estudos de Mercado de Capitais (Cemec) da Fipe e da consultoria Economática, informou ontem o Estado. Governo e Banco Central (BC) têm apresentado medidas para garantir alguma renda aos trabalhadores e expandir o crédito. São iniciativas corretas, avaliam respeitados economistas, mas é preciso ir mais longe, porque os desafios são muito maiores que os de qualquer crise anterior.

O governo tem de cuidar ao mesmo tempo de duas missões – preservar milhares de vidas ameaçadas por um vírus e limitar, tanto quanto possível, os danos econômicos da pandemia. São missões indissociáveis. Aumentar o risco de contágio para reativar os negócios seria uma experiência autodestruidora, como ficou claro em outros países.

Descartado esse erro, a defesa da economia será mais eficiente se a equipe econômica tiver uma avaliação clara das condições das empresas. O trabalho do Cemec-Fipe pode ser um bom começo. O quadro das grandes companhias foi baseado nos balanços de 2019 de 245 empresas de capital aberto.

O estudo simula a evolução das condições financeiras com paralisação de receitas. Em dois meses, 48,6% apresentariam saldo de caixa negativo, enquanto pouco mais da metade teria fôlego para continuar pagando fornecedores, folha de salários e outras despesas operacionais. Mesmo no caso das grandes, portanto, são limitadas as condições de segurança. “A situação das pequenas e médias é outra história, bem mais problemática, e exigirá medidas consistentes para evitar quebradeira”, comentou o coordenador do Cemec-Fipe, professor Carlos Antonio Rocca, ex-secretário de Fazenda de São Paulo.

Além de piores condições de caixa, as micro, pequenas e médias empresas têm dificuldade maior de acesso ao crédito, como lembram o professor Rocca e o presidente da Trevisan Escola de Negócios, VanDyck Silveira. Um dos efeitos dessa dificuldade, em 2019, foi o aumento das contas em atraso. A inadimplência das empresas cresceu por 11 meses seguidos. Em janeiro um recorde foi estabelecido, com 6,2 milhões de firmas com contas atrasadas e nome negativado. Em um ano a expansão chegou perto de 10%.

Desse total, 94,2% são micro e pequenos negócios, segundo o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian. Um crescimento econômico de apenas 1% ao ano, observou, nem chega aos pequenos negócios. Esse tem sido o padrão desde 2017, com ligeira piora em 2019 e, agora, um quadro de severa contração. Detalhe agravante: como 30% das dívidas em atraso são com outras empresas, há um efeito cascata.

Oitenta por cento dos empregos dependem dessas empresas, lembra VanDyck Silveira. A pandemia, segundo ele, poderia pôr na rua mais 5 milhões, levando a quase 17 milhões o total de desocupados. A taxa seria próxima de 16%. O risco de uma grande piora surge também nas contas do economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ. Se a economia se contrair 3,2%, como em seu cenário básico, o desemprego poderá chegar a 14,3% no fim do ano, em termos dessazonalizados.

Ampliar o apoio às empresas, principalmente às micro, pequenas e médias, é recomendação unânime dos analistas mais atentos ao dia a dia do setor privado. Medidas de crédito já anunciadas são basicamente corretas, mas nada garante que o dinheiro chegará às empresas mais necessitadas. José Márcio Camargo sugere a criação de um fundo, com recursos do Tesouro, para garantir empréstimos dos bancos públicos às menores empresas. O País ganharia se o governo se dispusesse a ouvir este e outros economistas conhecedores do mundo real das empresas e do emprego, dando uma folga temporária aos amigos da corte.

 

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