Por Carlos Américo Freitas Pinho
Criado pela Lei 10.097/2000, o contrato de aprendizagem é o único que permite às empresas admitirem menores de 16 anos, sendo válido para jovens a partir dos 14 e antes dos 24 anos de idade que se inscreverem, via instituições como Senat, Senac e Senai, no Programa de Aprendizagem.
Neste contrato de trabalho especial, o empregador deve assegurar a formação técnico-profissional, compatível com o desenvolvimento físico, moral e psicológico do aprendiz. Este, por sua vez, compromete-se a executar com zelo e diligência, tarefas necessárias à sua formação.
Ajustado sempre por escrito e por prazo determinado de até dois anos, o contrato de aprendizagem estabelece uma proporção que varia entre 5% e 15% de aprendizes entre os empregados de cada empresa.
A porcentagem varia conforme o total de funcionários dos estabelecimentos, que são obrigados a empregá-los e matriculá-los nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem. O objetivo de tais medidas é o da valorização do trabalho humano, respeitando a propriedade privada e sua função social, buscando reduzir as desigualdades sociais.
É importante observar que o programa visa a fornecer um ensino profissional, ofertando ao aprendiz condições de adquirir a experiência necessária para acessar o mercado de trabalho, independentemente de ser aproveitado pela própria empresa concedente. Trata-se, pois, de um compromisso com a inclusão e com o desenvolvimento desses jovens.
Contradição na faixa etária decisiva
É na faixa etária entre 18 e 24 anos que o aprendiz possui maiores chances de ser aproveitado em contratação definitiva pelas empresas. Também é comum que os jovens já nessa idade ainda não apresentem a experiência requerida por um potencial empregador para contratá-lo. Este cruzamento de fatores faz com que o vínculo de aprendizagem se mostre, frequentemente, o melhor caminho para superar tal obstáculo.
Ainda assim, não obstante a concessão de vagas nessa modalidade seja de caráter obrigatório, não raro as empresas encontram muitas dificuldades para preencher seus quadros de aprendizes, ante o desinteresse dos jovens.
Entretanto, a contradição se forma quando, alcançada a maioridade, muitos desses jovens já anseiam por fontes de renda que possam vir a ser definitivas. Evitam, portanto, o prazo limitado a dois anos que teriam como aprendizes com pagamentos a partir de um salário-mínimo-hora.
Com foco no momento presente do início da vida adulta, optam por trabalhos com remuneração que geralmente é apenas um pouco mais alta, frequentemente sem qualquer vínculo formal e quase sempre sem nenhuma formação profissional ancorada em estudos e metodologias.
Por pequenas vantagens imediatas, abrem mão do sistema de aprendizagem pelo qual teriam seis em cada oito horas de trabalho dedicadas à sua formação profissional, conforme as regras determinadas para esta modalidade de contrato.
Sem procura, sem multa
Quando o interesse é insuficiente entre os potenciais aprendizes, não cabe cominação de multa por descumprimento da legislação. Demonstrada a dificuldade de preencher vagas em aberto, os tribunais têm tomado o sentido de tornar insubsistente a penalidade legalmente prevista:
“RECURSO ORDINÁRIO. DIVERGÊNCIA TEMÁTICA. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL TRABALHISTA. MULTA APLICADA POR DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO RELATIVA ÀS COTAS DE APRENDIZAGEM. AUSÊNCIA DE VAGAS EM ENTIDADES QUALIFICADAS EM FORMAÇÃO TÉCNICO- PROFISSIONAL METÓDICA. INDIFERENÇA AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO CONHECIMENTO (TST, SÚMULA Nº 422, III).
A recorrente traz motivação inteiramente dissociada dos fundamentos do julgado (TST, Súmula nº 422, III). A nulidade da infração é calcada na comprovação dos esforços da recorrida no cumprimento da cota mínima de aprendizes através do envio de ofícios e cartas para os mais diversos órgãos e entidades, a exemplo do IFPI, Senac, Senai, Sescoop, Sest/Senat. Enfim, confirma a tese patronal do desinteresse pelas vagas de jovem aprendiz pela contratação efetiva ser mais vantajosa aos empregados.
Aliás, alternativamente a recorrida requereu, inclusive, a expedição de ofício às entidades enumeradas no artigo 50 Decreto nº 9.579/2018, na busca por jovens aprendizes elegíveis e curso de formação técnico- profissional metódica para a atividade de operador de telemarketing.
Configurada a divergência temática entre a fundamentação contida na decisão recorrida e as razões recursais, que sequer articulam argumentos diretos e específicos em relação à matéria decidida, isso implica o não conhecimento do recurso ordinário. Recurso ordinário não conhecido.
00001516-48.2019.5.22.0003, relator Arnaldo Boson Paes, Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região, 1ª Turma, julgado em 07/12/2020.”
Inegavelmente, órgãos governamentais devem promover ações que incentivem o jovem ao aprendizado profissional, ressaltando as vantagens de se possuir maior conhecimento técnico. No médio prazo, é essa capacitação que poderá promover sua melhora social, evitando uma sina de dependência do mercado informal.
Por fim, é mister ressaltar que, ao contratarem aprendizes, as empresas podem se beneficiar de uma série de incentivos fiscais e de diversos programas governamentais. É fundamental, então, que observem as contrapartidas geradas e estimulem a contração de aprendizes, inclusive para evitar a punição com multas, por descumprimento da referida cota.
Carlos Américo Freitas Pinho é advogado especialista em Direito do Trabalho e consultor jurídico da Fecomércio-RJ.
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