Por Notas & Informações
O Banco Central (BC) admitiu que as chances de a inflação romper a meta neste ano subiram de 57% para 83%. As projeções da edição mais recente do Relatório Trimestral de Inflação (RTI) apontam que o IPCA deve encerrar o ano em 5,8%, acima do objetivo central, de 3,25%, e do limite superior do intervalo de tolerância, de 4,75%. A informação não é exatamente uma novidade, haja vista que a inflação, embora tenha desacelerado, permanece em um patamar elevado, enquanto os núcleos da inflação, que excluem itens mais voláteis e indicam uma tendência mais precisa sobre o comportamento dos preços, continuam a aumentar.
Se no curto prazo o BC tem tido dificuldades para trazer a inflação ao centro da meta, no médio prazo a situação não é tão diferente. Para os próximos dois anos, a meta é de 3%, mas a projeção da autoridade monetária para a inflação de 2024 é de 3,6%; e para 2025, de 3,2%. No boletim Focus, as previsões do mercado para o IPCA são ainda mais pessimistas – de 5,93% em 2023, de 4,13% em 2024 e de 4% em 2025. O cenário, portanto, não abre espaço para a redução da Selic neste momento, a despeito de toda a pressão pública que o governo de Lula da Silva tem feito nesse sentido.
Tal como uma profecia autorrealizável, um dos aspectos que mais elevam o custo da desinflação é a desancoragem das expectativas. Para influenciar o mercado a reduzir essas estimativas, há algumas alternativas às quais as autoridades podem recorrer. Do governo, por exemplo, espera-se que demonstre seu comprometimento com a responsabilidade fiscal, não levante dúvidas sobre a credibilidade do sistema de metas de inflação e não questione a autonomia formal do Banco Central.
Ao BC, resta reafirmar seu firme compromisso com as metas, algo que a instituição tem feito em todas as comunicações oficiais. Foi o que a instituição fez na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na qual manteve a taxa básica de juros em 13,75%, e no Relatório de Inflação divulgado nesta semana, em que adotou o mesmo tom de cautela.
Alvo de ataques contínuos liderados por Lula da Silva, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, aproveitou a entrevista concedida após a divulgação do RTI para reforçar algumas mensagens caras à instituição e que não têm sido muito bem compreendidas. Ele reiterou que as decisões da autoridade monetária não têm um componente político, mas técnico. Esclareceu que a meta não é um objetivo que o BC persegue cegamente – do contrário, a Selic teria de estar em 26,5% ao ano. Reconheceu, no entanto, que o controle da inflação, objetivo fundamental da autoridade monetária, impõe um alto preço à sociedade como um todo.
“Eu diria aos brasileiros que o custo de combater a inflação é realmente muito alto, e parte deste custo é sentido no curto prazo. Mas o custo de não combater é muito mais alto, e é sentido no longo prazo de uma forma mais severa”, disse Campos Neto. O que o presidente do BC não disse, mas ficou implícito, é que, quando o governo joga contra esses objetivos, o custo para a sociedade é ainda maior.
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