14 de outubro, 2024

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O emprego na UTI

O Estado de S.Paulo

Contaminado pelo coronavírus, o mercado de trabalho fechou 4,9 milhões de vagas e acumulou recordes sinistros no trimestre móvel encerrado em abril. A população ocupada encolheu 5,2% e a massa de rendimentos diminuiu 3,3% em relação ao trimestre de novembro a janeiro. As duas variações foram as maiores da série iniciada em 2012. Com R$ 7,3 bilhões a menos na massa de rendimentos, o poder de consumo se reduziu, tornando mais fraca uma economia já em marcha lenta em janeiro e fevereiro, antes do primeiro impacto da pandemia. O desemprego de 12,8 milhões de trabalhadores no período de fevereiro a abril é um dos efeitos iniciais do surto de covid-19. Esse contingente corresponde a 12,6% da população economicamente ativa. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A realidade é mais feia que esse quadro, porque mais pessoas desistiram de buscar uma ocupação. Os desalentados, 5 milhões, também representam um recorde. Como deixaram de buscar emprego, deixaram igualmente de ser incluídos no total dos desempregados. Entre os dois trimestres aumentou também a população fora da força de trabalho. Com 5,2 milhões a mais do que no trimestre encerrado em janeiro, esse grupo chegou a 70,9 milhões, outro pico na série histórica.

Um detalhe curioso dessa pesquisa reflete a desigualdade. O rendimento médio mensal dos ocupados aumentou, enquanto a massa de rendimentos diminuiu. A explicação evidente é o efeito desigual da crise: os mais atingidos pelo desemprego foram os trabalhadores de menor remuneração, principalmente informais. Mesmo entre os de renda mais baixa a desigualdade ficou mais visível quando começou a distribuição do apoio oficial: muitos possíveis beneficiários tiveram dificuldade para receber o benefício, porque, sendo menos visíveis, eram excluídos pelas normas burocráticas. Isso também ocorreu em outras áreas da América Latina.

Como sempre, as más condições de emprego são mais visíveis na subutilização da força de trabalho do que nos dados do desemprego. Esse grupo incluiu, no período encerrado em abril, 28,7 milhões de pessoas. O total corresponde aos desempregados, subocupados por insuficiência de horas e componentes da força de trabalho potencial. Neste último grupo estão os desalentados e outros indivíduos capazes de trabalhar, mas fora da população economicamente ativa.

O impacto inicial da pandemia ficou bem visível, também, nos dados da ocupação formal, coletados no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia. Somente em abril foram fechadas 860.503 vagas com carteira assinada. Esse número é a diferença entre admissões e demissões. Contados os postos eliminados em março, o total do bimestre chegou a 1.101.205 empregos. A maior perda líquida de vagas ocorreu no setor de serviços, com fechamento de 474.145 vagas nos dois meses. A devastação ocorreu principalmente, como se poderia prever, na área de alojamento e alimentação, com 211.722 demissões.

Na indústria de transformação foram eliminadas, no bimestre março-abril, 224.407 vagas. Mas o impacto da pandemia, nesse caso, foi sensível principalmente em abril, porque as condições de emprego na indústria já eram muito ruins nos meses anteriores. Desde novembro a atividade industrial vinha derrapando. O mau desempenho do setor, em 2019 e no começo de 2020, foi uma das mais claras comprovações do quase descaso do governo em relação ao baixo ritmo de atividade e ao desemprego elevado. No trimestre encerrado em março, antes do forte impacto da pandemia, os desocupados eram 12,2% da força de trabalho.

As manifestações de preocupação do presidente Jair Bolsonaro com o crescimento econômico e a criação de empregos são recentes. São claramente eleitorais e usadas no discurso contra possíveis competidores na eleição de 2022, como os governadores de São Paulo e do Rio de Janeiro. Se ele tivesse cuidado da economia desde o ano passado, os brasileiros estariam em condições bem melhores para enfrentar os primeiros choques da crise atual.

 

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