15 de outubro, 2024

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O que esperar da Senacon de Wadih Damous?

O novo governo começa com pautas quentes a serem trabalhadas quando o assunto é defesa do consumidor, que vão desde o Novo Decreto do SAC, até o superendividamento. Para saber o que esperar e quais serão os principais desafios que o novo Secretário Nacional do Consumidor, Wadih Damous, a Consumidor Moderno conversou com Juliana Domingues, que esteve à frente da Senacon entre janeiro de 2020 e março de 2022.

Juliana é procuradora, chefe do Conselho Administrativo de Defesa Economica (CADE) e professora da Universidade de São Paulo (USP). Na entrevista à CM, Juliana reforçou que temas que envolvem setores regulados como o de telefonia, aviação civil, energia, saúde complementar e combustível vão sempre ser problemas a serem resolvidos por serem mercados com pouca concorrência e com poucas alternativas para os consumidores. Questões relacionadas à proteção de dados pessoais também devem continuar a figurar a pauta dos órgãos de defesa do consumidor por tempo indeterminado.

A chefe do Cade também citou a articulação com as demais lideranças do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor como um desafio para a Senacon e em especial para o secretário. Segundo ela, são muitos atores em busca de protagonismo e a construção de pontes será essencial para que a Secretaria consiga realizar um bom trabalho. Apesar dos desafios, Juliana afirmou que acredita que será um ano positivo para a pasta.

Confira abaixo, as respostas da procuradora Juliana Domingues, ex-Senacon, as perguntas feitas pela Consumidor Moderno.

CM: O que você espera da atuação da Senacon nesse novo governo?

Juliana Domingues: A Senacon passou a ter um grande protagonismo na época da pandemia e certamente terá no novo governo que priorizará questões voltadas aos mais vulneráveis.

Faço votos que a Secretária consiga mais “corpo”, ou seja, uma estrutura compatível com as inúmeras demandas. Isso não depende apenas do Secretário novo, uma vez que envolve orçamento o que é um dilema em todos os governos. Deixei registrado na minha gestão que a pasta precisa ter condições melhores de responder às inúmeras demandas nacionais que, às vezes, chegam “na baciada” como na pandemia. Durante a pandemia trabalhamos no limite humano e com muito espírito público.

Espero que políticas públicas iniciadas na pandemia voltadas à inclusão do consumidor com deficiência sigam sendo implementadas. Medidas voltadas às minorias são aderentes ao novo governo, assim como as políticas públicas voltadas para educação e para o empoderamento do consumidor, que podem ser aplicadas tanto por meio da Escola Nacional de Defesa do Consumidor, como através de campanhas.

Também é esperado que o consumidor.gov.br que foi iniciado no governo PT volte a crescer. Até a minha saída da pasta o consumidor.gov.br estávamos numa crescente recorde de demandas registradas e respondidas e chegamos a ultrapassar o Reclame Aqui, porém soube que isso foi mudando no último semestre e não sei o diagnóstico. O consumidor.gov.br é a plataforma de autocomposição de conflitos de consumo referência mundial e merece um olhar especial por tudo que representa.

CM: Quais serão os principais desafios da secretaria e do secretário esse ano?

Juliana Domingues: Creio que os temas se repetem com certa frequência em mercados onde há pouca concorrência e poucas opções aos consumidores. É um desafio permanente. Certamente o tema do superendividamento e dos consignados deve continuar em alta, assim como os que envolvem setores regulados (isto é, problemas com telefonia, energia, saúde suplementar, combustíveis, aviação civil etc) e proteção de dados dos consumidores.

O maior desafio é sempre equilibrar a parte preventiva com a repressiva e manter proximidade com as lideranças do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor que possuem agendas diversas. Nos Estados, muitos Procons estão trocando os dirigentes por exemplo. São muitos atores que compõe o SNDC, há uma busca por protagonismo e o diálogo sempre depende de dois lados.

Quando cheguei na Secretária priorizei o restabelecimento desse diálogo e conseguimos avançar na aprovação do Projeto 3515 e aprovamos, por unanimidade, um novo Decreto do SAC após mais de 30 horas de debates no CNDC e mais duas audiências públicas. Ele precisa ser regulamentado e pode mudar completamente a realidade diante de um mecanismo de avaliação das respostas do SAC que dará evidência às empresas que não atendem adequadamente os consumidores.

Acredito que será um ano positivo para a Senacon diante da redução das demandas consumeristas na área do turismo, por exemplo, assim como diante do controle da pandemia.

Caso o governo opte por priorizar a agenda internacional do consumidor, na OCDE já deixamos um caminho pavimentado. No Mercosul, OEA e na UNCTAD as discussões são relevantes para posicionar o Brasil sempre nas melhores práticas internacionais.

CM: Por que a segurança jurídica é importante?

Juliana Domingues: Por mais que se investigue e haja, ao final, a aplicação de sanções administrativas isso é quase enxugar gelo porque o poder econômico de muitas empresas e o ambiente favorável à judicialização fomenta processos judiciais que se estendem por mais de dez anos: perdem a administração pública e os consumidores.

Quando há violação, as sanções devem ser aplicadas. Mas o teto estabelecido de pouco mais de 11 milhões de reais é irrisório para muitas empresas que numa análise de custo/benefício acabam reincidindo ou estendendo a demanda no judiciário. Ou seja, os problemas seguem porque vale a pena para os maus fornecedores. Soma-se a isso um cenário de insegurança jurídica.

Fizemos uma consultoria do Pnud e há um estudo da professora Flavia do Canto que mostram mais de 20 critérios de dosimetria para a aplicação de sanções administrativas e, âmbito estadual na área do consumidor que promovem insegurança jurídica e mostram que há grandes disparidades no SNDC.

Tudo isso motiva discussões judiciais que são ruins tanto para os bons fornecedores como para os consumidores. Esse tema é de interesse do Conselho Nacional de Justiça e outros stakeholders com quem tivemos pautas conjuntas e que certamente poderão construir pautas igualmente relevantes com o novo governo.

Eu estarei sempre à disposição para ajudar e colaborar para melhorias, seja onde estou (CADE) ou como acadêmica. Precisamos pensar no melhor para o nosso país e para a nossa sociedade.

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