Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O maior risco para o País é a saída do governo do ministro da Economia, Paulo Guedes, segundo gestores do mercado financeiro ouvidos em recente pesquisa do Bradesco BBI. O perigo de uma segunda onda do novo coronavírus aparece em seguida na escala das preocupações. Mas por que o ministro deixaria o posto? A resposta a essa pergunta remete ao principal fator de insegurança, o presidente Jair Bolsonaro. Além de prejudicar o combate à pandemia, sua atuação tem provocado péssimos efeitos na economia, elevando a incerteza, assustando investidores e convertendo o Brasil em zona de perigo. Pressionado com frequência pelo presidente, por seus aliados e também por outras figuras do Executivo, o chefe da equipe econômica foi visto no mercado, durante semanas, como a bola da vez no jogo das demissões. Ele sobrevive, mas o temor permanece.
O próximo ministro da Saúde, é difícil duvidar, será submisso aos interesses do presidente da República e a seus pontos de vista contrários à ciência e à prática médica. O desastre será mais amplo se também o Ministério da Economia ficar subordinado, integralmente, às conveniências pessoais e familiares do chefe do Executivo. Basta pensar nas negociações com o Centrão para entender os temores de muitos agentes do mercado.
Além da esperada negociação, já iniciada, de postos no governo e nas empresas federais, os objetivos eleitorais poderão afetar os fundamentos da economia. Isso ocorrerá se for afrouxado o programa de ajustes fiscais e de reformas. Esse programa, segundo os compromissos conhecidos até hoje, deverá ser integralmente retomado no próximo ano, depois de esgotada a fase de calamidade fixada em lei. A partir daí, e com as contas públicas já severamente afetadas pelas medidas emergenciais, será preciso iniciar um duro e indispensável trabalho de arrumação.
A confiança na execução desse trabalho é fundamental para a avaliação de risco do Brasil. As expectativas, no entanto, são inevitavelmente afetadas quando o presidente mantém a política em estado de crise, latente ou explícita, com pressões contra seus ministros e agressões a representantes do Judiciário e do Legislativo ou diretamente a esses Poderes.
Efeitos dessa crise permanente são facilmente visíveis na fuga de capitais e na depreciação do real. A valorização do dólar, de cerca de 45% neste ano, até a metade de maio, acrescentou mais de R$ 900 bilhões à dívida externa de empresas e instituições bancárias brasileiras. Com isso, o endividamento, medido em moeda nacional, saltou de R$ 1,939 trilhão em janeiro para R$ 2,846 trilhões neste mês, segundo dados do Banco Central (BC). A variação decorreu quase exclusivamente do câmbio, porque poucos empréstimos foram tomados nesse período. A situação, também de acordo com o BC, é particularmente complicada para as empresas – cerca de 20% – desprovidas de mecanismos de defesa contra a variação cambial.
Esse é um bom exemplo dos danos causados ao setor empresarial pelas ações do presidente, orientadas por seus objetivos eleitorais e por suas preocupações com familiares e companheiros.
Em menos de um ano e meio nove ministros foram demitidos ou se demitiram. Em menos de um mês saíram dois ministros da Saúde, por discordarem das orientações anticientíficas e perigosas do presidente, e um ministro da Justiça, por discordar de interferência política na Polícia Federal, órgão de Estado em princípio imune a interesses de governantes.
Afastado o ministro da Justiça, o ministro Paulo Guedes foi apontado no setor financeiro como o próximo alvo de seu chefe. O ministro sobrevive e tem sido ocasionalmente prestigiado em momentos mais críticos para o presidente. Mas a insegurança no mercado permanece. Não está em jogo apenas a manutenção da responsabilidade fiscal. Se a economia for reaberta de forma precipitada e atabalhoada, sem atenção ao risco sanitário, o episódio seguinte, como se viu em outros países, poderá ser um novo tombo. Haverá mais atraso na recuperação, como sabe o mercado. Também isso o presidente ignora.
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