Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O desmatamento explodiu na Amazônia. Pelas projeções do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no final de 2020 a taxa deverá superar 13.100 km², um crescimento de 186,5% em relação a 2012, quando o desmatamento foi reduzido para a menor taxa da história, 4.571 km². No Pantanal, as queimadas atingiram o maior índice em mais de 20 anos. Enquanto isso, o volume de recursos dos fundos internacionais alocados no Brasil segue em queda livre. O País chegou a ter uma fatia de 2,5% das carteiras globais em 2009. Mas em junho, segundo a consultoria EPFR Global, o volume encolheu para 0,18%, o menor desde 2001. O governo, contudo, não se emenda.
Como apurado pelo Estado, o valor previsto pelo governo para o Ibama na proposta de orçamento para 2021, que deve apresentar ao Congresso até 31 de agosto, é 33,6% inferior ao deste ano. Para o segmento de fiscalização e combate aos incêndios florestais o corte é ainda mais fundo: 43%. Dada a possibilidade de contração do PIB de 5% a 10%, com quedas na arrecadação combinadas aos gastos emergenciais para enfrentar a crise sanitária e econômica, os sacrifícios serão, sem dúvida, inevitáveis. Ainda assim, cortar quase pela metade os recursos para o combate ao desmatamento parece excessivo.
Na mesma semana, o Ibama foi obrigado a reduzir o número de seus helicópteros para vigiar o desmatamento. Em vez das atuais seis aeronaves, o órgão passará a contar com apenas quatro para monitorar não só a Amazônia, mas todo o território nacional.
Mas quanto mais o pandemônio ambiental foge ao controle, mais o governo insiste na sua única estratégia ambiental: matar o mensageiro e desacreditar a mensagem.
Conforme apurou o Estado, o chefe do Centro de Operações Aéreas do Ibama, Everton Almada Pimentel, fez sucessivos alertas nos últimos dois meses sobre os prejuízos que a redução do número de helicópteros traria ao combate ao desmatamento, e tentou viabilizar soluções menos drásticas. A solução encontrada pelo governo foi exonerá-lo.
Logo após a divulgação dos dados do Inpe, o vice-presidente da República e coordenador do Conselho da Amazônia, Hamilton Mourão, veio a público para afirmar que os sistemas de monitoramento brasileiros “não são os melhores” e precisam ser aprimorados. Naturalmente, é sempre possível melhorar – ainda que, segundo artigo publicado no Estado por 19 pesquisadores de ponta, o monitoramento no Brasil seja bastante eficaz. Mas, obviamente, os sistemas de monitoramento só expõem os sintomas e não têm nenhuma relação com a sua causa. Aliás, com toda probabilidade, um sistema mais preciso mostraria que a doença é ainda mais grave. Foi talvez pensando nisso, por sinal, que poucos dias antes o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a ensaiar uma proposta de redução das metas de desmatamento.
Enquanto isso, a reputação internacional do Brasil é carbonizada a olhos vistos. A queda no volume de investimentos é uma tendência desde 2015 e tem causas múltiplas, como o descontrole fiscal e a instabilidade política. Mas os especialistas apontam unanimemente o descaso ambiental como um dos fatores de intensificação desta queda nos últimos dois anos.
Apesar disso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, indagado num evento internacional sobre as políticas ambientais do País, criticou os EUA pelo seu histórico de desmatamento e agressão às populações indígenas. Admitindo-se que haja algo de razão nestas invectivas, cabe a pergunta: em que elas ajudam a trazer investimentos para o Brasil?
No protagonismo ambiental, “até o governo passado, o Brasil era um dos players principais”, lamentou o ex-embaixador Rubens Ricupero a propósito do esvaziamento dos quadros dedicados à questão ambiental no Itamaraty. “O Brasil se anulou internacionalmente, não tem mais nada a dizer.” A bem da verdade, melhor – ou menos ruim – seria se fosse assim. Mas, como se vê pelas manifestações de Guedes e Salles, o governo tem muito a dizer. Só que tudo o que diz despeja combustível nas chamas que devoram os biomas e as oportunidades do País.
Comentários