(*) José Pastore
O Fórum Econômico Mundial (Davos) estima que o mundo precisará requalificar 1
bilhão de trabalhadores até 2030. Só para atender a indústria de transformação e da
construção civil do Brasil, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) vê a
necessidade de qualificar mais de 10 milhões de trabalhadores até 2025. Agricultura,
comércio e serviços, igualmente, requerem qualificação e requalificação de milhões de
trabalhadores. E para todos esses setores, necessita-se de uma requalificação
permanente que permita acompanhar a grande velocidade de mudança nos métodos de
produzir e vender.
Trata-se de um desafio imenso e de extrema complexidade. A escola sozinha, não dá
conta do recado por não conhecer a natureza da demanda. A empresa igualmente é
impotente por não conseguir proporcionar a educação básica que é indispensável para se
aprender as novas profissões. O governo tampouco está aparelhado para acompanhar as
meteóricas mudanças no mundo do trabalho.
Esse desafio exige uma íntima interface entre escola, empresa e governo. É isso que se
observa nos países avançados onde o governo cria os estímulos e as escolas e empresas
realizam a qualificação.
Na Europa, especialmente nos países do norte, os investimentos em qualificação e
requalificação contínuas vêm aumentando a cada ano tanto por parte das médias e
grandes empresas como das escolas de formação profissional, com frequência,
amparados por incentivos governamentais (Konstantinos Pouliakas e Patricia Wruuk,
“Corporate training and skill gaps”, Bonn: Institute of Labor Economics, 2022). O
mesmo ocorre nos Estados Unidos e em países da Ásia (“Top content providers for
upskilling and reskilling employees”, Plataform e-Learning Industry, 2022).
No Brasil, temos 2.300 universidades corporativas que cuidam da capacitação do
pessoal de empresas, além de 2 a 3 milhões de jovens que se formam nas escolas do
Sistema S, as do setor público e as particulares. Mas, tudo isso ainda é pouco perto das
necessidades do país. O resultado de todo esse esforço está qualificando menos de 10%
da nossa força de trabalho enquanto nos países avançados isso sempre ultrapassa os
40%.
Em nosso país, temos o agravante da má qualidade do ensino fundamental e médio da
maioria das nossas escolas. Ou seja, entre nós, falta não apenas trabalhadores
qualificados, mas, sobretudo, trabalhadores qualificáveis. Por isso, o nosso desafio é
ainda maior. Sempre vi com bons olhos o movimento de Santa Catarina “Indústria pela
Educação” promovido pela Federação das Indústrias daquele estado que procura superar
as deficiências de educação básica dos jovens, para então qualificá-los nas profissões
demandadas. São mais de 2 mil indústrias e 350 mil trabalhadores. Hoje em dia, todo o
estado se engajou nessa parceria, envolvendo também o comércio, serviços, atividades
agropecuárias e os órgãos de educação do governo. É o movimento Santa Catarina pela
Educação.
Os resultados têm sido promissores tanto para os jovens como para as empresas. Uma
boa educação básica é fundamental para os trabalhadores acompanharem a evolução das
tecnologias e se prepararem para profissões que não existem hoje, mas que existirão
amanhã.
Poucas empresas têm escala para criar universidades corporativas, mas, pequenas e
médias se beneficiam, de arranjos como o realizado naquele estado. Vale a pena ampliar
essa iniciativa.
José Pastore – Professor da Universidade de São Paulo e presidente do Conselho de Emprego e
Relações do Trabalho da Fecomercio-SP. É membro da Academia Paulista de Letras.
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