A revisora de estamparia de uma fábrica de roupas em São Luiz dos Montes Belos (GO), portadora de deficiência auditiva, receberá indenização por danos morais, após comprovar na Justiça do Trabalho sua exclusão social no ambiente de trabalho. Os membros da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), acompanharam o voto da relatora, desembargadora Iara Rios, para considerar que, verificada a barreira de comunicação entre a funcionária e os colegas, e comprovada sua exclusão social, bem como a atuação ineficaz da empresa no sentido de reduzir ou superar tal barreira, está presente ato violador da integridade moral da empregada, a ensejar a reparação.
A empregada, contratada como revisora de estamparia, buscou reparação judicial por entender que seus direitos fundamentais que garantem o mínimo necessário para que um indivíduo exista de forma digna dentro de uma sociedade não foram respeitados no ambiente laboral. De acordo com a ação, a funcionária não foi tratada com respeito por seus superiores e colegas desde o início do contrato. A revisora disse que, após descobrirem sua deficiência auditiva, os colegas a excluíram do convívio social, deixando-a desconfortável no ambiente de trabalho.
Alegou não haver acessibilidade para a compreensão da forma de execução das tarefas, pois o superior imediato não explicava as tarefas de forma compreensível e adequada para suas necessidades. A trabalhadora afirmou que na maioria do tempo se comunicou pela escrita e por gestos, o que teria dificultado a compreensão das próprias necessidades e das necessidades empresariais. Pontuou que a presença de uma intérprete ou a adoção de um sistema legendado, por exemplo, poderiam ter atuado de forma eficaz para a compreensão das tarefas a serem executadas. Informou que não suportou o assédio sofrido e pediu demissão.
O Juízo da Vara do Trabalho de São Luís de Montes Belos (GO) julgou procedente o pedido de indenização por dano moral e condenou a empresa a pagar R$40 mil reais a esse título. A indústria, no entanto, recorreu ao TRT. Alegou não ter sido comprovada a omissão sobre as mazelas relatadas pela funcionária. Ressaltou que, conforme depoimento da trabalhadora, o instrutor operacional da empregada passava as orientações em libras. Defendeu que a funcionária não tinha dificuldades para compreender os serviços e, portanto, não haveria a ausência de acessibilidade alegada pela revisora de estamparia.
A empresa ainda afirmou realizar treinamentos internos e cursos de libras para os funcionários, além de oferecer um guia prático sobre pessoas com deficiência (PCDs). Para a fábrica de roupas, são formas de atuar na valorização da diversidade, com a finalidade de promover a igualdade e a eliminação de barreiras entre os funcionários. Concluiu o recurso afirmando que não houve a produção de sobre o tratamento diferenciado, perseguição, opressão, privação da dignidade, repreensões e intolerância no estabelecimento, de acordo com o artigo 818 da CLT e artigo 373 do CPC. Requereu a reforma da sentença para que o pedido de dano moral fosse julgado improcedente, ou alternativamente, caso o dano moral fosse reconhecido, que o valor da condenação fosse reduzido.
A relatora entendeu haver provas de inobservância do dever de criação de um ambiente acessível e inclusivo para a funcionária pela empresa. “Não havia empregado capaz de se comunicar eficazmente com a reclamante em libras na empresa, nem iniciativa suficiente desta no sentido de propiciar uma melhor comunicação entre os empregados com deficiência e seus colegas de trabalho”, ressaltou.
A magistrada pontuou também que, embora a empresa alegue e algumas testemunhas tenham confirmado, que o supervisor passava as informações em libras à trabalhadora, durante o depoimento dele em audiência, o instrutor não soube se expressar em libras para a intérprete presente em juízo. O próprio supervisor relatou que o curso de libras durou apenas dois dias. “Vê-se que o conhecimento do instrutor acerca da linguagem de sinais era parco e insuficiente para propiciar uma adequada comunicação com a reclamante e a sua inclusão no ambiente de trabalho”, concluiu a relatora.
Rios apontou que o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015 ) dispõe no seu art. 34, § 1º, que “as pessoas jurídicas de direito público, privado ou de qualquer natureza são obrigadas a garantir ambientes de trabalho acessíveis e inclusivos”. Pontuou que a acessibilidade está também relacionada à redução ou superação de barreiras na comunicação e na informação, entendidas como “qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens e de informações por intermédio de sistemas de comunicação e de tecnologia da informação”.
A desembargadora entendeu que, no caso dos autos, embora a funcionária conseguisse desempenhar as atividades profissionais, havia uma exclusão social da empregada no meio de trabalho, considerando a barreira de comunicação entre ela e os demais colegas, o que caracterizava discriminação, nos termos do art. 4º, § 1º, da Lei nº 13.146/2015. A relatora apontou a atuação ineficaz da empresa para reduzir ou superar a barreira a acessibilidade de comunicação e reconheceu o prejuízo à integridade moral da trabalhadora.
“Não se pode dizer que não tenha havido nenhuma iniciativa da reclamada pela inclusão da reclamante, mas apenas que essa iniciativa não foi completamente eficaz”, disse ao analisar o valor arbitrado para a reparação por danos morais. Iara Rios considerou as iniciativas da empresa de manter um canal de ética, a divulgação aos empregados de um “guia prático sobre pessoas com deficiência” e a tentativa de que o supervisor aprendesse a linguagem de sinais. Nesse sentido, determinou a redução do valor anteriormente arbitrado em R$ 40 mil para cinco mil reais, valor equivalente a cinco vezes a remuneração constante do termo de rescisão da funcionária.
Processo: 0010544-94.2022.5.18.0181
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 18ª Região Goiania, 13.06.2023
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