08 de dezembro, 2024

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Trégua no câmbio

Notas & Informações, O Estado de S.Paulo

Com o dólar menos pressionado, o Brasil colhe o primeiro benefício econômico da vitória de Joe Biden na eleição presidencial americana. Outros benefícios dependerão de mudanças, muito incertas por enquanto, na estratégia comercial da Casa Branca. No médio prazo, o fortalecimento da cooperação internacional e do multilateralismo, bandeiras do candidato democrata, poderão reduzir tensões nos mercados e favorecer o crescimento global. Neste momento, o câmbio mais comportado, num cenário financeiro mais otimista, pode ser contado como ganho relevante, se nenhum susto realimentar o nervosismo.

Menor pressão inflacionária será um dos bons efeitos da tranquilidade maior no mercado cambial. O dólar mais caro tem sido um importante fator da alta de preços. Isso foi reconhecido pelo Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC), na ata de sua última reunião. A “depreciação persistente do real” foi apontada, nesse documento, como uma das causas da aceleração inflacionária. A linguagem pode ser mais engravatada que a do dia a dia, mas o diagnóstico é claro.

Câmbio mais estável e preços contidos são importantes por mais de uma razão. Os benefícios para as famílias, especialmente em tempo de baixa atividade, alto desemprego e orçamento apertado, são evidentes. Mas essa estabilidade também facilita o planejamento empresarial e, portanto, o bom funcionamento da economia.

A desvalorização cambial, lembrarão alguns, beneficia as exportações, barateando os produtos nacionais em moeda estrangeira. Em princípio, sim, mas também o planejamento do comércio é prejudicado quando as cotações oscilam intensamente. Nessas condições, falta segurança para a fixação de preços e as decisões se tornam mais complicadas. Para os negócios, assim como para a gestão pública, ações seguras dependem de um mínimo de previsibilidade.

Por enquanto, a melhora de humor no mercado financeiro, perceptível desde o fim da semana passada, em nada afetou as projeções para os próximos três anos. Como de costume, o Banco Central fechou na sexta-feira a coleta de estimativas para este ano e para os três seguintes. O relatório, baseado em consultas a cerca de cem instituições, foi divulgado ontem.

Em uma semana a expectativa de inflação em 2020 passou de 3,02% para 3,20%. Há um mês a estimativa apontava 2,47% de alta para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Para 2021 a projeção subiu em uma semana de 3,11% para 3,17%. A pressão, segundo os cálculos, deve continuar, embora os números devam ser, até 2023, compatíveis com as metas oficiais.

A projeção do câmbio ficou em R$ 5,45 por dólar, a mesma da semana anterior, mas um pouco mais alta que a de um mês antes (R$ 5,30). A taxa deve recuar a partir de 2021, mas só em 2023 deverá ficar de novo um pouco abaixo de R$ 5,00. A cotação estimada para esse ano é de R$ 4,94.

As contas públicas continuarão pressionadas, mas, de toda forma, ainda se estima um ajuste gradual. Em 2023, no entanto, o saldo primário, isto é, sem o peso dos juros, ainda será negativo, com déficit equivalente a 1,50% do Produto Interno Bruto (PIB). Não haverá sobra, mesmo dentro de três anos, para amortização e controle mais firme da dívida pública.

O detalhe mais otimista, em relação ao curto prazo, é a expectativa de contração econômica de 4,80% em 2020, resultado melhor que o estimado quatro semanas antes (-5,03%). O novo número está mais próximo da estimativa oficial (cerca de -4,60%). Mas a expectativa de crescimento em 2021 declinou em um mês de 3,50% para 3,21%. Para os anos seguintes a projeção reflete o baixo potencial de crescimento estimado para o Brasil (2,50%).

As apostas poderão rapidamente piorar, se aumentarem as pressões contra a responsabilidade fiscal. Tolerante a essas pressões, o presidente da República tem sido um fator de insegurança. A mudança externa derrubou o dólar, mas o principal fator de instabilidade é interno, está instalado no gabinete presidencial e pode manifestar-se a qualquer momento.

 

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