Wilson Risolia, O Estado de S.Paulo
Estudo recente do Banco Mundial estima que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil poderia ser 158% maior, se as crianças desenvolvessem todo o seu potencial e o País alcançasse o pleno-emprego. Portanto, estamos falando de um PIB 2,5 vezes maior.
O Banco Mundial também desenvolveu o Índice de Capital Humano (ICH), que combina dados de educação e saúde para estimar a produtividade da futura geração de trabalhadores. Especificamente, o ICH é composto por taxa de mortalidade e déficit de crescimento infantil, anos de escolaridade e resultados de aprendizagem, bem como pela taxa de sobrevivência de adultos.
O índice varia de zero a 1, em que 1 representa o pleno potencial. No caso do Brasil, o ICH é de 0,6, ou seja, uma criança nascida no Brasil em 2019 chegará aos 18 anos com apenas 60% do seu potencial. Em razão das nossas desigualdades regionais, esse desperdício pode ser ainda maior, dependendo do local de nascimento da criança. Uma realidade cruel, porque ninguém escolhe onde nascer.
Apenas para efeito de comparação, o México e o Chile têm índices de 0,61 e de 0,65, respectivamente. Coreia do Sul e Japão, de 0,80. A conclusão é de que o Brasil precisaria de 60 anos para alcançar os índices atuais de países desenvolvidos.
Esse estudo, como tantos outros, deveria despertar nosso senso de urgência, mas, infelizmente, isso não acontece. Existe uma distância abissal entre o que vem sendo feito (nada, para os pessimistas, ou quase nada, para os otimistas) e o que deveria ser feito.
Capital humano para empresas pode ser entendido como o conjunto de oportunidades criadas a partir do acúmulo de conhecimentos e habilidades de seus colaboradores. Ou, simplesmente, agregação de valor a partir de conhecimentos acumulados. No caso de um país, o significado é o mesmo, porém com maior intensidade, até porque, resumidamente, trata-se do conjunto de conhecimentos usados para produzir e maximizar valor econômico. E, quanto maior o valor econômico, maiores serão as chances de alcançar a prosperidade enquanto nação.
O estudo também explicita uma mazela histórica que não conseguimos resolver: a desigualdade.
Não podemos normalizar o sofrimento recorrente de uma criança que não tem alimentação, educação, condições básicas de saúde e de habitação. Devemos interromper este ciclo com um projeto robusto de educação. É o que chamo de Plano Real para a Educação. A mesma indignação e intolerância que tivemos com a inflação devemos ter com esta realidade cruel que assola nossas juventudes, nossas gerações futuras, sob pena de não termos futuro. Simples assim.
A lição que ainda não conseguimos aprender é que a política pública deve partir do pressuposto de que devemos analisar e enfrentar os problemas de maneira inflexível, fazendo o que precisa ser feito, independentemente de crenças e/ou ideologias políticas. Do contrário, podemos despender recursos e energia gerencial sem alcançar os resultados esperados.
Que futuro tem um país que permite que mais de 500 mil jovens de 15 anos cheguem à idade adulta sem ter concluído a educação básica (Estudo Insper-Fundação Roberto Marinho)?
Que futuro tem um país que normaliza o fato de mais da metade da sua população carcerária ter entre 18 anos e 29 anos? Dados de 2021 apontam que mais de 90% dessa população não concluiu o ensino médio. Ou será que acreditamos que contravenção e crime são obras do acaso?
Que futuro tem um país que admite que apenas 5,2% dos jovens no ensino médio tenham aprendizado adequado em Matemática? Como admitir que 36,5% dos jovens com 19 anos não tenham concluído o ensino médio?
Que futuro tem um país no qual 31,2% dos jovens com 18 anos a 24 anos não estudam e não trabalham?
Que futuro tem um país com 11 milhões de analfabetos (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2019) e que, no presente, tem quase 1/3 da população analfabeta funcional?
Que futuro tem um país que insiste em dar as costas à educação orientada para e pelo mercado de trabalho?
O amor às crianças se converte em benefício econômico. Se esse amor não for genuíno (como deve ser), que ao menos se encontre na racionalidade econômica o gatilho para amar. Já está comprovado que, para cada US$ 1 investido numa criança, US$ 7 são revertidos ao longo da vida. Esse retorno será percebido pela sociedade sob a forma de emprego, renda, segurança, saúde e redução das desigualdades.
Investir e acreditar nas crianças e nos jovens não é apenas um ato de amor. Se os responsáveis pelas políticas públicas não se movem pelo coração, deveriam fazê-lo pelo bolso ou pelo medo de um futuro incerto. Quero dizer, finalmente, que o amor pelas crianças é, na verdade, um ato de lucidez para com o futuro.
*
DIRETOR DE ESTRATÉGIAS EDUCACIONAIS DO SESI E DO SENAI-SP
Comentários