Artigo – Folga aos domingos para as mulheres: tratamento justo ou cilada?

(*) Alvaro Furtado

 

No Brasil da década de 40, como reflexo da própria sociedade, as revistas femininas exaltavam a mulher perfeita: dona de casa, boa mãe e boa esposa, que está sempre bonita e elegante para o marido. Trabalhar fora? Nem pensar, afinal não se devia pôr em risco o matrimônio!

 

Sim, os tempos mudaram, e como! Os avanços culturais e sociais e a realidade econômica das últimas décadas do século passado abriram um caminho sem volta para a inserção das mulheres no mercado de trabalho, fosse por desejo próprio ou por necessidade. Se não trabalhar já foi a regra para uma parcela significativa das mulheres brasileiras, hoje é uma rara exceção.

 

Entretanto, o mundo do trabalho ainda vive à mercê de leis da mesma década de 1940, como a própria CLT (Decreto-lei nº 5.452/1943), que já passou por centenas de mudanças desde então para se adaptar às novas necessidades, expectativas e até profissões da atualidade.

 

A polêmica mais recente diz respeito ao trabalho das mulheres aos domingos, que surgiu em face de uma ação movida contra as Lojas Riachuelo, que acabou chegando ao STF, onde uma das Turmas do Supremo decidiu que as mulheres têm direito a uma folga alternada, um domingo trabalha e o outro não, cumprindo assim o art. 386 da CLT.

 

O art. 386, da CLT, que é disposição integrante do Capítulo referente à Proteção do Trabalho da Mulher, estabelece que, havendo trabalho aos domingos, deverá ser organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical.

 

Ocorre que esse critério conflita com o disposto no art. 6º, da Lei 10.101/00, que estabelece que o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo, o que classificamos como revezamento 2X1 (a cada dois domingos trabalhados o empregado e/ou empregada descansam no seguinte).

 

Essa sistemática é a que vem sendo adotada pela grande maioria das empresas comerciais, até porque essa era a posição majoritária do TST, onde apenas duas turmas entendiam que o revezamento deveria ser quinzenal.

 

Isso significa que, em pleno século XXI, estamos tentando ressuscitar uma norma inserida no mundo jurídico na primeira metade do século passado…

 

Parece interessante às mulheres que trabalham no varejo de alimentos, principalmente nos supermercados, poder ter folga em domingos alternados. Entretanto, no fundo isso é uma armadilha, porque o trabalho delas passa a ficar mais caro do que o realizado por homens, se isso prevalecer. O resultado, que já começou a acontecer, é a substituição de mulheres por homens nos postos de trabalho.

 

O que parece uma proteção, se mostra o contrário: as mulheres que tiverem folgas em domingos alternados provavelmente folgarão todos os domingos… porque estarão desempregadas.

 

Esta ainda é uma decisão provisória e que provavelmente será revista pelo STF em algum momento do ano que vem. Até lá é prudente que as empresas observem cuidadosamente as escalas e obedeçam ao que consta das normas coletivas. Por enquanto, não há obrigatoriedade de inserir na convenção ou cumprir domingos alternados para as mulheres.

 

Se hipoteticamente acontecer uma decisão do STF nesse sentido, com certeza será em algum momento modulada, o que quer dizer que será definido o momento e como vai valer, porque se assim não for, as empresas estarão praticamente quebradas, com cinco anos para repor eventuais trabalhos fora desse regime.

 

A orientação é esperar o que será definido no STF, sem esquecer que a tendência é a automatização do trabalho, pois muitos supermercados já têm caixas automáticos, ou seja, o número de empregados tende a diminuir nos estabelecimentos do varejo de alimentos. É uma outra relevante questão que teremos de enfrentar mais adiante.

 

No mundo ideal, o revezamento deveria se aplicar a todos os empregados, independentemente de gênero, o que traria segurança para todos.

 

Alvaro Furtado é presidente do Sincovaga-SP