As leis do passado e o futuro do emprego

(*) Alvaro Furtado

 

A tal da inteligência artificial está entre nós em situações corriqueiras e em outras nem tanto. Sem que percebamos, estamos pedindo o almoço, comprando roupa e fazendo as compras de supermercado pelo celular, sendo lembrados de sair de casa para um compromisso pelo aplicativo, que já calculou a rota, e até sendo operados por um robô na sala de cirurgia.

A revolução tecnológica por trás dessas mudanças, oferecidas a quem pode usufruir delas como símbolos de conforto e segurança, tem efeitos incômodos para os que não conseguiram acompanhar essa velocidade.

Se nos concentrarmos apenas no mundo do trabalho, podemos citar a substituição de muitos postos de trabalho pelo computador e pelas máquinas, o surgimento de profissões sem regulamentação e, em certos casos mais críticos, até mesmo a extinção de uma atividade.

Para as situações que podem ser previstas, temos a lei. Já para as demais… e é aí que mora o perigo. As necessidades e demandas criadas em pouco mais de uma década são inúmeras. Ao longo da história, as leis raramente acompanharam a evolução da tecnologia, da sociedade e do trabalho com a mesma agilidade, o que pode causar insegurança jurídica e lentidão nos processos. E não é por falta de leis: no Brasil estima-se que passem de 5 milhões.

Uma das mais famosas é a Lei nº 5.452, de 01/05/1943, a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que acaba de completar 80 anos. Podemos concordar que seria pior sem ela, mas é impossível que uma lei octogenária seja capaz de regular todos os tipos de contratações existentes hoje.

Algumas transformações e atualizações foram realizadas na CLT ao longo do tempo, mas ainda não são suficientes para garantir o equilíbrio entre liberdade, flexibilidade e formalização do trabalho.

Ironicamente, há casos em que, por não acompanhar sua época, a lei pode até mesmo dificultar a vida do trabalhador. Um exemplo é que a CLT ainda contém algumas disposições de aplicação exclusivamente às mulheres.

É o caso da obrigatoriedade de concessão de uma folga aos domingos, a cada 15 dias, para quem trabalha em regime de escala, como em comércios, indústrias, etc. Esta previsão está no artigo 386 da CLT, e continua em vigor.

À luz do século XXI, que motivo há para uma escala diferenciada entre homens e mulheres? Em vez de proteção, a lei fecha portas para as profissionais, no momento em que o Brasil bate recordes de desemprego e em que, segundo o IBGE, mais de 48% dos lares têm mulheres como chefes de família.

A legislação relativa à mulher empregada tem a nobre finalidade de proteger o sexo “frágil”, mas acaba discriminando-o. Ao também encarecer enormemente a remuneração devida às trabalhadoras, as leis trabalhistas levam os empregadores a contratar homens no lugar de mulheres.

Outros temas merecem e podem passar por atualizações na legislação trabalhista, como trabalho intermitente, home office, trabalho aos domingos e regularização do trabalhador por aplicativo, resultado das novas demandas atuais.

Não somente aqui, mas muitos países estão passando no momento por dificuldades em seus mercados de trabalho por conta de leis que, por não acompanharem os novos tempos, geram mais desemprego e estimulam a informalidade. No Brasil, não haveria por que ser diferente, um desafio para todos, dos legisladores aos trabalhadores.

 

Alvaro Furtado é presidente do Sincovaga-SP (Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado de São Paulo).