Por Luiz Guilherme Gerbelli
Os analistas que acompanham o ritmo da atividade econômica entraram desde 2021 num movimento de revisar para cima, de forma frequente, suas previsões de início de ano para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2023, o roteiro é o mesmo: as projeções iniciais apontavam um crescimento na faixa de 0,5% e 1%; hoje, estão próximas de 3%.
Entre os economistas, uma das hipóteses que pode ajudar a explicar essas revisões tem a ver com as reformas realizadas por diferentes governos nos últimos anos. A leitura é a de que elas ajudaram a aumentar o PIB potencial — a capacidade do País de crescer sem gerar desequilíbrios econômicos. Da faixa de 1% a 1,5%, passou para o patamar de 1,5% a 2%.
“O País fez várias reformas a partir de 2016, cujo impacto acumulado tende a ser positivo para o PIB”, diz Fernando Gonçalves, superintendente de pesquisa macroeconômica do Itaú Unibanco.
Na lista de reformas endereçadas, estão a da Previdência, a trabalhista — que reduziu a insegurança jurídica no mercado de trabalho, por exemplo —, a autonomia do Banco Central, a criação do marco do saneamento e a adoção de regras fiscais, como o teto de gastos e o arcabouço fiscal, que, apesar de imperfeitas, tentam dar alguma visibilidade para as contas públicas. No longo prazo, espera-se que a tributária, ainda em tramitação, também traga ganhos.
Na avaliação de economistas, é difícil quantificar quanto cada reforma trouxe de impacto positivo para o PIB brasileiro, mas a avaliação é que esse conjunto de medidas pode ter sido capaz de mudar o patamar de crescimento do País.
“Nós, economistas, subestimamos os efeitos das várias reformas feitas no Brasil nos últimos anos”, afirma Fernando Honorato, economista-chefe do banco Bradesco. “E não é um fenômeno só registrado pelos economistas brasileiros. Para o FMI (Fundo Monetário Internacional), o Brasil foi o país que teve a maior surpresa de crescimento em 2023. É representativo de algo que está acontecendo.”
Em outubro, o fundo revisou a previsão de crescimento do Brasil de 2,1% para 3,1%, e colocou a economia brasileira como a nona maior do mundo neste ano.
Nesse contexto de revisão geral, incluindo os organismos internacionais, Honorato também cita uma “inércia do pessimismo” com o Brasil depois da recessão do biênio de 2015 e 2016. “Foi uma crise muito severa que levou a PIBs que nunca tínhamos vistos nos últimos 100 anos.”
“O período em que houve a crise profunda no Brasil pode ter contaminado a avaliação”, diz Honorato.
Fatores pontuais
Além das reformas promovidas nos últimos anos, como a trabalhista e a da Previdência, fatores conjunturais podem ajudar a explicar o desempenho econômico melhor do que o esperado nos últimos anos.
Estímulos monetários e fiscais adotados pelo governo para combater os estragos causados pela pandemia de covid, que se somam a medidas recentes, como o reajuste real do mínimo e do salário dos servidores, estão entre os pontos levantados por economistas como explicações para ajudar a entender as diferenças entre as projeções e o PIB efetivo.
No auge da crise sanitária, a maioria dos governos despejou recursos para socorrer famílias e empresas. Bancos Centrais promoveram um longo ciclo de redução das taxas de juros. No Brasil, a Selic caiu a 2%.
Mesmo na pandemia, em 2020, as previsões mais pessimistas para o Brasil foram sendo deixadas de lado. O Fundo Monetário Internacional (FMI) chegou a projetar uma queda de 9,1% para o PIB brasileiro naquele ano. É verdade que a economia recuou, mas a recessão foi bem menor, de 3,3%.
“O efeito de política fiscal deve ir se acomodando, mas desde a pandemia temos muitas coisas acontecendo”, diz Eduardo Jarra, economista-chefe da Santander Asset Management. “Houve alta da quantidade de pessoas com acesso ao Auxílio Brasil (hoje Bolsa Família), tem a questão do salário mínimo e do (reajuste do) funcionalismo. Houve uma sequência de medidas.”
Em 2023, o PIB brasileiro ainda tem sido ajudado pelo bom desempenho do mercado de trabalho formal e do agronegócio. O País colheu uma supersafra e se beneficiou de preços ainda elevados das commodities no cenário internacional.
País colheu uma supersafra e se beneficiou de preços ainda elevados das commodities
Foto: Tiago Queiroz/Estadão
“O primeiro trimestre (do agronegócio) foi muito forte e tem efeitos indiretos seja em setores de logísticas e até financeiros”, diz Jarra.
E o que esperar?
Nos próximos anos, a previsão é que a economia brasileira tenha um desempenho muito próximo ao da nova faixa do PIB potencial.
Em 2024, por exemplo, a estimativa no relatório Focus, pesquisa divulgada pelo Banco Central com uma centena de economistas, é que o PIB cresça 1,5%, subindo para 1,93% em 2025 e 2% em 2026.
Nesse cenário, portanto, se não há uma preocupação com uma grande desaceleração, também não se espera uma grande aceleração do crescimento. Uma nova subida de patamar só virá com a volta do investimento, que está praticamente estagnado, e a redução das incertezas fiscais — se o País conseguir melhorar o desempenho das contas públicas, contribui para reduzir os juros da economia.
“O fato de o investimento não subir tem a ver com as incertezas nas economias, mas também com os juros altos. No processo de queda de juros, devemos ter alguma recuperação do investimento”, diz Fernando Gonçalves, superintendente de pesquisa macroeconômica do Itaú Unibanco.
Projeção do FMI
Para este ano, o FMI projeta um crescimento de 3,1% para o Brasil e de 3% para a economia global. O PIB dos emergentes deve avançar 4%. Em outubro, o Fundo se mostrou mais otimista com o País. A previsão anterior era de uma alta de 2,1%.
“O Brasil voltou a ser um país mais normal, que cresce em linha com a economia global”, afirma Fernando Honorato, economista-chefe do banco Bradesco.
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