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Uma retomada com muitas baixas

Notas & Informações, O Estado de S.Paulo

 

Aumentam as falências, um dos piores efeitos econômicos da pandemia, enquanto a atividade se recupera, ainda lentamente, do primeiro impacto da nova crise. Também nos mercados, sobreviver é uma vitória para ser comemorada, especialmente quando falta à maior parte das empresas o acesso ao crédito, respirador reservado a clientes de primeira classe. O cenário da reativação combina áreas de luminosidade e zonas de escuridão e incertezas. No lado mais claro, a visão da retomada inicial é enriquecida com novos detalhes. Um dos componentes positivos é o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br). Segundo esse indicador, a produção cresceu 1,31% em maio, depois de ter encolhido 6,14% em março e 9,45% em abril.

A sinalização positiva – a economia volta a se mexer – havia sido antecipada por dois indicadores setoriais. O aumento da produção industrial em maio (7%) e a expansão das vendas no comércio varejista (13,9%) já haviam sido apontados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Um terceiro dado, o de serviços, havia sido negativo (-0,9%). Esses números, além de uma estimativa da produção agropecuária, foram usados no cálculo do IBC-Br, também conhecido no mercado como “prévia do PIB”.

Embora animadora, a reação mostrada pelas contas do Banco Central quase desaparece quando se examinam períodos mais longos. No trimestre ainda houve baixa de 6,94%. Além disso, o IBC-Br de maio foi 15,09% inferior ao de um ano antes. A comparação dos números de janeiro-maio deste ano e de 2019 apontou um recuo de 4,15%. Em 12 meses a queda ficou em 0,52%.

Os números positivos coexistem com indicadores muito ruins de solvência empresarial e de emprego. Em junho o número de falências foi 71,3% maior que o de um ano antes, segundo a Boa Vista SCPC. No caso dos pedidos de recuperação judicial, houve aumento de 4,6% em relação a igual mês de 2019. Os dois dados haviam melhorado no começo do ano e voltaram a crescer com a nova crise.

Essa onda de insolvências envolve empresas já em dificuldades antes da pandemia, segundo especialistas citados em reportagem do Estado. A quebradeira, acrescentam essas fontes, deve ainda aumentar, porque muitas empresas enfrentam graves problemas de caixa. De acordo com os mesmos especialistas, algumas empresas credoras têm sido tolerantes, evitando aumentar a pressão financeira sobre as companhias em dificuldades.

Problemas de caixa eram previsíveis, principalmente para as micro, pequenas e médias firmas, desde os primeiros sinais da nova crise. Segundo estudo divulgado na época, só parte das grandes empresas conseguiria atravessar pelo menos dois meses sem esgotar seus meios financeiros. A profecia se confirma. Os problemas atingiram companhias de todos os tamanhos, mesmo autorizadas a reduzir temporariamente jornadas e salários.

Empresas grandes e médias puderam recorrer ao crédito para reforço de caixa. O Banco Central estimulou a expansão do financiamento e a oferta de dinheiro aumentou. Mas o benefício ficou inacessível a grande parte das companhias mais necessitadas. Entre o início da crise e o fim de junho, a parcela das menores firmas em busca de empréstimo passou de 39% para 46%, mas o sucesso aumentou muito menos – de 16% para 18%, segundo o Sebrae, o Serviço Brasileiro da Apoio às Micro e Pequenas Empresas. Apesar das dificuldades, também nesse universo há sinais de reação. Para muitos micro e pequenos empresários, no entanto, até o dinheiro para as despesas iniciais da reabertura pode faltar, adverte o presidente do Sebrae, Carlos Melles.

A reativação começou para boa parte das empresas, mas o futuro próximo continua obscurecido por muitas incertezas, principalmente para as micro e pequenas. Apesar de seu tamanho, essas firmas são importantíssimas fontes de emprego e, portanto, de renda para o consumo. Não está claro se o governo sabe disso. Mas deveria saber e pensar em como se poderá garantir a recuperação dessa enorme e preciosa constelação de pequenos astros.