Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O Estadão teve acesso exclusivo a um relatório elaborado pelo Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e à Unifase, que, somado a estudos de outras instituições, envolvendo diferentes indicadores, compõe um tenebroso mosaico de retrocessos sociais.
Em 2021, segundo o Observa Infância, foram registradas 113 internações por desnutrição de bebês com até 1 ano a cada 100 mil nascimentos. Trata-se do pior resultado nos últimos 14 anos. Em números absolutos, só no ano passado 2.939 bebês nessa faixa etária precisaram de suporte médico-hospitalar simplesmente porque não estavam alimentados como deveriam nesse estágio da vida.
Uma sociedade civilizada não convive com a fome e a insegurança alimentar de tantos milhões de seus cidadãos, principalmente as crianças, como se fosse um dado da natureza, um infortúnio qualquer que não merecesse a comiseração de todos nem ações mais incisivas dos governantes de turno. Se convivem com isso sem perder o sono, aceitam a barbárie.
Ora, ninguém de boa-fé, seja qual for a sua afiliação político-partidária, há de acreditar que o Brasil está muito bem administrado quando a desnutrição infantil, após tantos anos, volta a representar risco de morte para bebês de até 1 ano. Nem é aceitável que tantas mães, elas mesmas padecendo da dor da fome, vivam a angústia de só ter o leite materno para oferecer às suas crianças.
Esse problema é ainda mais grave na Região Nordeste, que registrou um número de internações de bebês com até 1 ano desnutridos 51% maior do que a média nacional: foram 171,5 hospitalizações por 100 mil nascimentos em 2021.
“O que essas hospitalizações por desnutrição representam?”, questionou Cristiano Boccolini, coordenador do Observa Infância. “Não é só fome. Há todo um contexto de vulnerabilidade social envolvido.”
De fato, o aumento da desnutrição infantil é apenas mais um dado a revelar o enorme salto para trás que o Brasil tem dado nos últimos quatro anos. O governo do presidente Jair Bolsonaro será lembrado por muitas razões, mas a atenção aos desvalidos decerto não é uma delas. Bolsonaro só se ocupou de cuidar de uma massa de brasileiros abandonados pelo Estado na exata medida de seus interesses eleitorais.
A volta do espectro da fome e da insegurança alimentar se soma à queda vertiginosa da cobertura vacinal de nossas crianças contra doenças que haviam sido erradicadas, à destruição de políticas públicas na área de educação, à crônica falta de saneamento básico e acesso à água tratada para milhões de brasileiros, à leniência no combate aos crimes ambientais, entre outros recuos civilizatórios.
Obviamente, Bolsonaro não deu causa a um ou outro desses problemas, mas sua inépcia e desinteresse agravaram todos eles. Nada de concreto foi feito durante o seu governo para reverter esse quadro de miséria crônica.
Seja quem for o próximo presidente da República, se Jair Bolsonaro ou Lula da Silva, uma coisa é certa: não cuidar desses milhões de brasileiros esquecidos revelará mais do que incompetência: revelará uma falha de caráter.
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