14 de outubro, 2024

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Não é só Lula que deve ser cobrado

Notas&Informações, O Estado de S.Paulo

O País não merece e não quer que a campanha do segundo turno da eleição presidencial reproduza o espetáculo lamentável de acusações que marcaram o primeiro turno, praticamente sem discussão aprofundada dos grandes problemas que afligem a população e exigem ação corajosa, determinada e eficiente dos governantes. É preciso que os dois postulantes escolhidos pelos eleitores para disputar este segundo turno apresentem propostas concretas que componham um plano de governo realista. Só assim a escolha de 156 milhões de eleitores poderá se basear em expectativas construídas a partir de programas de ação do poder público nos próximos quatro anos, não de promessas vagas. É natural, pois, que segmentos do empresariado, como mostrou recente reportagem do Estadão, comecem desde já a condicionar suas escolhas a propostas efetivas, sobretudo no campo econômico e fiscal.

A experiência político-administrativa dos dois postulantes é conhecida do País. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o atual, Jair Bolsonaro, já mostraram como utilizam os instrumentos de poder. Mas isso é passado. Agora, precisam dizer o que pretendem fazer a partir de 2023.

É por causa dessa experiência que, especialmente no caso do candidato do PT, as cobranças iniciais têm como foco o que, desta vez, Lula se propõe a fazer nos campos econômico e social. Durante a campanha do primeiro turno, sempre que cobrado sobre seu programa de governo, Lula evitou falar com clareza, afirmando genericamente que apoiaria o crescimento e faria o governo trabalhar em favor dos mais desprotegidos. Combater desigualdades com responsabilidade, como Lula tem dito, é uma boa frase de palanque, mas não diz nada sobre planos reais.

Se repetir em seu eventual novo governo experiências como o uso intensivo de bancos públicos para financiar segmentos e empresas de sua preferência, poderá repetir também o desastre que foi a ação do BNDES. A destruição do arcabouço fiscal durante o governo petista de Dilma Rousseff, de sua parte, não apenas levou ao seu afastamento da Presidência, como plantou a desconfiança da sociedade quanto à capacidade das administrações petistas de respeitar o dinheiro público. A desconfiança persiste.

É natural, por isso, que parte do empresariado – bem como, provavelmente, parcelas crescentes do eleitorado daqui até 30 de outubro – cobre desde já respostas claras do candidato do PT a respeito de sua agenda no campo fiscal, já que Lula já disse que revogará o teto de gastos sem apresentar alternativa e sem se comprometer com uma política de controle da expansão das despesas públicas.

Mas essa cobrança não pode se limitar a Lula. Os empresários também precisam questionar o presidente Jair Bolsonaro a respeito de seus planos, já que em seu primeiro mandato, por variadas razões, ele não entregou quase nada do que prometeu, especialmente reformas, modernização do Estado e privatizações.

Muito ao contrário, Bolsonaro fez rigorosamente tudo o que os empresários de pendor bolsonarista acusam Lula da Silva de planejar fazer caso volte ao poder. O atual presidente nunca demonstrou interesse pelas reformas – e sabotou o quanto pôde a única aprovada no seu mandato, a da Previdência –, destruiu o teto de gastos, deu calote no pagamento dos precatórios, comprou apoio político com o orçamento secreto e envergonhou o País no exterior, com sua política ambiental suicida e sua predileção por populistas autoritários.

Bolsonaro, ademais, limitou sua “política social” (aspas necessárias) à distribuição desbragada de dinheiro para pobres, sem qualquer contrapartida ou critério, numa evidente compra de votos – exatamente aquilo que ele e seus apoiadores sempre acusaram o PT de fazer com o Bolsa Família.

Compreende-se perfeitamente que os empresários estejam preocupados com a volta de Lula da Silva ao poder, sobretudo à luz do desastre econômico causado pelos governos lulopetistas. Mas esses empresários precisam demandar de Bolsonaro o mesmo compromisso com a racionalidade econômica e administrativa que cobram de Lula. Afinal, de nada adianta impedir a volta de Lula ao poder se Bolsonaro se sente à vontade para fazer ainda pior.

 

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