Por Leticia Miranda (Bloomberg Opinion)
Assim que o Walmart (WMT) anunciou que estava fechando uma série de lojas em Chicago, nos Estados Unidos, a empresa virou centro de debates culturais pelo país. Alguns no Twitter culparam o movimento pelo “crime descontrolado” e pela falta de legislação.
Outros disseram que era uma antecipação do aumento da criminalidade sob o recém-eleito prefeito democrata da cidade, Brandon Johnson, que fez campanha em uma abordagem mais holística da segurança pública que se concentra nas causas profundas do crime, como pobreza sistêmica e saúde mental.
Mas os principais motivos para o fechamento das lojas refletem mais escolhas financeiras que as varejistas foram obrigadas a fazer do que o argumento de um aumento dos crimes na região.
Com o aumento das vendas online, varejistas de grande escala, como o Walmart, estão procurando formas de se desfazer de imóveis caros e não lucrativos à medida que aumentam a presença no e-commerce. Segundo a empresa, as lojas do Walmart em Chicago “não são lucrativas desde que abrimos a primeira, há quase 17 anos”. As perdas anuais quase dobraram apenas nos últimos cinco anos, acrescentou.
O comunicado feito na última terça-feira (11) parecia tentar se esquivar de alguma responsabilidade pelo fraco desempenho, dizendo que a empresa tentou estratégias diferentes e discutiu seus desafios com o governo local antes de concluir que não havia nada que os líderes da cidade pudessem fazer para ajudar a tornar lucrativas as lojas fechadas.
De forma mais objetiva, o Walmart disse à Bloomberg News que o crime e o roubo não foram os principais fatores de sua decisão.
Como uma loja principalmente física, as margens do Walmart são pequenas em comparação com sua rival mais próxima: a gigante do comércio eletrônico Amazon (AMZN). As margens operacionais do Walmart despencaram na última década, quando as pessoas recorreram à Amazon para compras de produtos com preços mais elevados como brinquedos e artigos para a casa.
Isso fez com que o Walmart desenhasse um plano ambicioso de recuperação. Na semana passada, a empresa disse aos investidores que busca um crescimento de 4% nas vendas e um aumento de 4% na receita operacional nos próximos três a cinco anos, em parte fortalecendo sua força de e-commerce.
Uma fatia maior de US$ 18 bilhões em gastos de capital neste ano será destinada à atualização de sua cadeia de suprimentos, e o foco no reforço do comércio eletrônico provavelmente não mudará. Com esse tipo de gasto, a empresa precisa aumentar a dívida – em um ambiente difícil de empréstimos – ou então cortar os custos.
O plano do Walmart de reduzir sua presença em Chicago também tem relação com a migração doméstica. Um ditado comum no setor de varejo é que as lojas seguem os moradores, o que significa que os varejistas vão atrás das pessoas para onde quer que elas se mudem.
Isso ganha ainda mais escala na era do trabalho remoto, em que aumentou o número de pessoas que deixaram as cidades e se mudaram para os subúrbios.
Vista da região de downtown em Chicago: preços mais caros do metro quadro (Christopher Dilts/Bloomberg)(Bloomberg/Christopher Dilts)
Historicamente, o Walmart sempre evitou as cidades em parte por causa dos custos imobiliários mais altos, embora tenha experimentado lojas de formato menor nos grandes centros, incluindo Chicago. Mas sua força é o varejo suburbano e seu novo foco é atrair compradores de renda mais alta que, para sua sorte, se mudaram para os subúrbios.
Isso também afeta diretamente a outra força do Walmart: os mantimentos para a casa. Os consumidores que trabalham remotamente nos subúrbios têm maior probabilidade de comprar ingredientes para preparar o almoço em casa.
O sucesso com lojas de varejo também depende muito do local. Embora as pessoas estejam voltando às compras físicas em lojas depois de alguns anos trancadas em suas casas por causa da pandemia, elas não querem ir a lojas ruins.
Em comparação com outras opções nos quatro bairros afetados, as lojas do Walmart simplesmente não oferecem uma experiência tão boa. A poucos quarteirões, os consumidores podem encontrar as lojas da Target e da Costco.
Há também a opção do supermercado de baixo custo Aldi Stores; os preços do Walmart são baixos, mas não tão baixos quanto os da Aldi, o que torna difícil atrair consumidores mais relevantes.
Por todos esses motivos, a decisão do Walmart faz sentido. O que é preocupante é o gap profundo que esses fechamentos podem deixar nas comunidades, principalmente naquelas sem muitas opções.
Dois anos depois que o Walmart abriu uma loja no bairro de Austin em Chicago, por exemplo, 82 outras lojas fecharam – e há varejistas localizadas mais perto do Walmart com alta probabilidade de fazer o mesmo.
Esse padrão se repetiu em áreas rurais como Oriental, na Carolina do Norte, que ficou sem um supermercado quando a gigante do varejo decidiu fechar sua loja.
Ninguém deveria se surpreender com o fato de que os movimentos da companhia em Chicago geraram comentários racistas. As empresas, incluindo o Walmart, compartilham parte da responsabilidade em alimentar as falas online de “se for contra o preconceito, o racismo e a discriminação, vai à falência”.
Nos últimos dois anos, as varejistas têm feito uma campanha incansável contra o roubo em suas lojas, alegando que o crime organizado na cidade está aumentando.
Em dezembro, o CEO do Walmart, Doug McMillon, disse à rede CNBC que as lojas poderiam fechar e os preços poderiam aumentar devido a roubos. Mas há evidências de que o roubo no varejo não é tão dramático quanto alguns varejistas afirmam.
No início deste ano, um executivo da rede de farmácias Walgreens disse que a empresa pode ter exagerado o nível de roubo em suas lojas e “provavelmente” gastou muito em medidas de segurança.
Portanto, pode ser tentador apontar para o novo prefeito de Chicago ou para o roubo no varejo como motivos para a decisão do Walmart de fechar lojas. Mas, na verdade, é apenas parte do negócio para uma mega varejista que quer manter seus lucros crescendo.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Leticia Miranda é colunista da Bloomberg Opinion que cobre bens de consumo e o setor de varejo. Anteriormente, foi repórter de negócios na NBC News e repórter de varejo no BuzzFeed News.
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