A legislação trabalhista brasileira estabelece em seu artigo 456-A (Consolidação das Leis do Trabalho) que compete ao empregador “definir o padrão de vestimenta no meio ambiente laboral”.
Assim, a empresa, no exercício do poder diretivo para conduzir suas atividades da forma que melhor lhe aprouver, pode determinar não só a utilização obrigatória de uniformes, como também impor a seus empregados que se vistam de determinada forma; usem uma cor específica; ou, um modelo de roupa padrão (artigo 2º da CLT).
Nessa hipótese, o empregador deverá fornecer, gratuitamente aos trabalhadores, os artigos exigidos para a prestação de serviços.
Essa obrigação decorre da interpretação do artigo 166 da CLT, segundo o qual os equipamentos de proteção individual necessários e adequados ao exercício de suas atividades serão fornecidos pelo empregador aos empregados, sem qualquer custo.
O conceito de equipamentos necessários para o exercício das funções engloba os uniformes e as vestimentas exigidas pela empresa, que também deverão ser concedidas em quantidade suficiente aos empregados.
Neste sentido é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, pacificado pelo Precedente Normativo nº 115, segundo o qual:
“Determina-se o fornecimento gratuito de uniformes, desde que exigido seu uso pelo empregador.”
Ora, o uso do uniforme pelos empregados é uma ferramenta publicitária eficiente para a empresa promover e divulgar a sua marca, além de transmitir a sensação de organização, higiene e segurança.
Ocorre que, apesar de o empregador arcar com os custos dessa exigência, os eventuais valores gastos não terão natureza salarial. Diferentemente de um bem ou serviço concedido ao empregado, em razão do trabalho, como salário-utilidade (salário “in natura”), a concessão do uniforme não tem natureza salarial, nos exatos termos do inciso I, § 2º, do artigo 458, da CLT:
“Art. 458 – Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que a empresa, por fôrça do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
- 2º. Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salárioas seguintes utilidades concedidas pelo empregador:
I – vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação do serviço;”
Descumprimento e razoabilidade
Dessa forma, por se tratar de uma obrigação, o descumprimento injustificado do uso do uniforme pelo empregado permite sua penalização, mediante a aplicação de advertência, suspensão ou, até mesmo, da dispensa por justa causa.
A determinação referente ao uso de uniforme ou a certo padrão de vestimenta deve observar a razoabilidade da obrigação, compatibilizada com a função exercida pelo empregado, que pode variar de acordo com a profissão, o local da prestação de serviços e outras circunstâncias que se apliquem ao caso concreto.
Da mesma forma, quando se tratar de peça de vestuário não habitual ao uso diário, deve existir uma proporcionalidade entre o custo dos artigos e a remuneração do empregado, de forma que os valores gastos não comprometam de maneira significativa seus proventos, sob pena de transferir os riscos do empreendimento ao trabalhador.
Em regra, o fato de o empregador determinar o uso de calças e sapatos de cores sóbrias pelos empregados, por exemplo, não pode ser considerado, por si só, exorbitante ou passível de ressarcimento e indenização.
De fato, não nos parece que tal regra possa ser confundida com a exigência do uso de uniforme, já que não há estipulação de uma cor específica, uma vestimenta determinada ou, um traje padrão. Ademais, a definição de “cores sóbrias” é ampla o suficiente para alcançar cores escuras ou claras; roupas estampadas ou lisas; saias ou calças; o que permite a utilização de uma grande variedade e opções de vestimentas. Sobre a questão, a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região é bem clara:
“USO DE UNIFORME. EXIGÊNCIA EMPRESÁRIA Embora se perceba a existência do padrão de vestimenta apontado pelo autor, o depoimento não foi, de fato, suficiente para amparar a restituição pretendida pelo autor, pois, como bem entendido pelo MM. Juízo “a quo”, mera exigência de cor comum e usual não se mostra capaz de configurar imposição abusiva de uniforme, em prejuízo do empregado, considerando se tratar de item e especificação comum e normalmente utilizada pela maioria das pessoas nas atividades cotidianas.” (TRT-3 – ROT: 00104906920205030132 MG 0010490-69.2020.5.03.0132, Relator: Milton V. Thibau de Almeida, Data de Julgamento: 11/08/2022, Terceira Turma, Data de Publicação: 16/08/2022.)
Traje social
Entretanto, quando o empregador determinar a utilização de traje social, como: blazer, saia, meias e sapatos de salto, ou, costume composto por terno, camisa de manga longa, calça social e gravata, a situação é diferente.
Ainda que o traje social possa ser considerado de uso comum e de grande variedade de oferta no mercado, não é mais, nos dias de hoje, indumentária indispensável para a maioria dos trabalhadores. Ao revés, esta vestimenta é exigida apenas em áreas restritas e ambientes sociais, constituindo verdadeira exceção à regra.
Neste caso, ao determinar o tipo de roupas e sapatos a serem usados pelo empregado, a empresa sobrepõe seu interesse econômico à privacidade e intimidade do trabalhador, já que o dever de arcar com os custos do negócio e, portanto, com as roupas utilizadas pelo empregado no exercício de suas funções, é do empregador.
Como se não bastasse, a imposição de determinado padrão na aparência dos empregados é circunstância inerente à organização e ao desenvolvimento das atividades empresariais, que tem como objetivo otimizar os respectivos resultados.
é advogada, professora da PUC na graduação e pós-graduação e sócia do escritório Abud e Marques Sociedade de Advogadas.
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