A internet criou inúmeras ferramentas que podem ser utilizadas para o entretenimento, a difusão de conhecimento e o desenvolvimento de negócios, com destaque para o varejo online, que movimenta um mercado bilionário todos os anos no Brasil, incluindo os supermercados. Nenhuma delas, porém, conquistou tantos adeptos quanto as redes sociais, um espaço de interatividade que reúne mais de 150 milhões de usuários só no nosso país.
Essas interações, sejam a trabalho, estudo ou lazer, por meio das redes sociais, naturalmente estimulam as relações de amizade e interesse entre as pessoas, que buscam se agrupar com seus semelhantes. O problema é que, como em toda relação, nem sempre há concordância, e o que era um espaço para troca de experiências pode se transformar em via para disseminação de conflitos e intolerância. Some-se a isso à polarização política, que acirrou ainda mais os debates nas redes nos últimos tempos.
Comportamentos inadequados nas redes sociais, sejam fotos, opiniões ou vídeos comprometedores ou difamatórios, deixam rastros, em alguns casos para sempre, e podem refletir negativamente na vida profissional, tanto dos usuários quanto das empresas envolvidas.
Hoje é possível saber muitos aspectos sobre uma pessoa, suas preferências, onde trabalha, quais seus passatempos, sem nunca tê-la visto pessoalmente. Um recrutador ou gestor, por exemplo, no primeiro momento levará em consideração a imagem que o candidato construiu no mundo virtual, não necessariamente quem de fato ele é. A qualidade dessa exposição pode abrir ou fechar portas e trazer até mesmo problemas jurídicos.
“É difícil, quase impossível, dizer que existem dois mundos: o físico e o virtual. Isto porque, no materialismo real, esses mundos não podem mais se separar um do outro. O que nós somos nas redes sociais é uma extensão do que somos no dia a dia, na vida prática, na nossa rotina com a nossa família, amigos e colegas de profissão”, afirma Adriano Mendes, advogado especialista em Proteção de Dados Pessoais e sócio do Assis e Mendes Advogados.
Na opinião dele, isso traz benefícios, como, por exemplo, interagir com pessoas em outro continente sem sequer tirar o pijama e não ter que enfrentar horas e horas em avião ou gastar rios de dinheiro. “Mas isso também traz muitos malefícios… Nós não sabemos mais quando paramos de interagir. A nossa vida é resumida pelo número de horas que ficamos em frente às telas…”, avalia.
Pense antes de postar
E é justamente por ficarmos muito tempo conectados, que podemos perder a noção e o bom senso. Especialistas em redes sociais listam alguns dos erros mais comuns dos usuários, dos quais nem sempre eles se dão conta: mentir sobre o currículo, uso incorreto da língua portuguesa, fazer reclamações infundadas sobre produtos e serviços, criticar o atual ou o antigo empregador, fazer comentários preconceituosos, utilizar palavras de baixo calão e disseminar fake news.
As redes sociais revolucionaram a forma como socializamos e isso requer diversos cuidados, segundo o advogado. “Nenhum ser humano é isento de preconceitos e pensamentos que não merecem ser falados em voz alta, mas a internet trouxe essa ideia (errada) de ‘liberdade’ e ‘impunidade’, de que um post na rede social não significa nada. Que basta apagar uma fala racista, misógina e/ou homofóbica que é isso aí: sem consequências!”. Não é bem assim.
Para começar, a internet não é “terra sem ninguém”, alerta Mendes. “Na ausência de legislações específicas, as leis que se aplicam ao ‘mundo físico’, também vão se aplicar quando estivermos utilizando as redes sociais. A liberdade de cada um termina onde começa a do outro, então nem tudo pode ser blindado com a frase ‘essa é apenas a minha opinião’. A depender do teor do posicionamento que foi exposto para milhares de pessoas, o cidadão pode sim ser rigorosamente punido sob a égide das leis vigentes.
E esse cuidado com a forma com que nos colocamos e nos expomos nas redes sociais, obviamente, também ajuda a preservar a nossa imagem no contexto profissional, segundo o especialista do escritório Assis e Mendes Advogados.
Presença na web exige cautela
O mesmo se aplica à conduta dos estabelecimentos comerciais, que também constroem sua trajetória nas redes sociais, cada vez mais empregadas para criar laços e fazer negócios com seus consumidores. Se os valores e princípios de uma empresa no ambiente virtual não condizem com a realidade, ela será facilmente punida por seus seguidores e pode até ser “cancelada”.
“As empresas estão cada vez mais envolvidas com os princípios de ESG (Governança ambiental, social e corporativa) e não querem ser associadas com parceiros, fornecedores ou colaboradores que são vistos como pessoas que negam direitos sociais, proliferam preconceitos datados e prejudiciais e/ou não respeitam o meio ambiente como se deve”, diz Mendes. “Por isso, elas vão ‘correr’ de qualquer relação com profissionais que, de alguma forma, possam manchar a imagem e a reputação corporativa positiva, que é tão importante e difícil de se construir.”
Então, para aquele profissional que acha que as redes sociais são um “mundo à parte” e que o tipo de conteúdo que acessa e compartilha não reverbera, o especialista dá um conselho: “Pense antes de agir, pois qualquer passo em falso pode prejudicar a sua vida pessoal e profissional de forma irreversível”.
Segundo Mendes, muitas empresas possuem procedimentos sérios em seus processos seletivos, como o chamado ‘background check’ ou verificação de antecedentes. Neste momento, dentro dos limites legais, a empregadora checa toda a documentação apresentada pelo possível funcionário para fins de verificar a autenticidade e também para entender se os posicionamentos daquele profissional fazem sentido com a visão, missão e valores da própria organização.
“Além disso, tudo fica mais fácil quando as pessoas estão expondo comportamentos socialmente inadequados ou até criminosos de forma pública em suas redes sociais, o que, infelizmente, vem acontecendo com recorrência. A educação e o respeito são os pilares de uma jornada profissional que beneficia não só o funcionário, mas também os empregadores”, completa.
Comentários